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quinta-feira, 21 de outubro de 2010

AS PAIXÕES E OS INTERESSES

Prestes ao ser preso em 1936
 A capacidade de colocar interesses coletivos, sejam de partidos ou de instituições, acima dos interesses pessoais, é uma qualidade rara em políticos contemporâneos. Mas nós temos alguns exemplos históricos: um deles é o de Luís Carlos Prestes. Ele comandou a lendária Coluna Prestes, tropa que percorreu 24 mil quilômetros pelo interior do Brasil lutando contra a oligarquia sem jamais ter sido derrotada pelas forças federais, embora tenha se internado na Bolívia em 1927.

Olga Benário Prestes

Convertido ao marxismo, Prestes, de origem militar e positivista, virou líder do Partido Comunista do Brasil e tentou liderar uma insurreição vermelha em 1935 a partir de quartéis e com o apoio da III Internacional de Moscou. A repressão foi violentíssima e ele acabaria preso um ano depois junto com a mulher, a alemã Olga Benário, agente da inteligência militar soviética. Judia e comunista, ela foi deportada para a Alemanha por determinação do Supremo Tribunal Federal, que atendeu ao pedido de extradição feito pelo governo nazista. Olga estava grávida e morreria em 1942 no campo de concentração de Ravensbrück, depois de dar à luz uma menina, Anita Leocádia Prestes.  E a "Intentona Comunista", como a direita chamava a insurreição, abriria caminho para a instalação do Estado Novo, em 1937.

Tropas da FEB fazem o desfile da vitória
Com a participação das tropas brasileiras na luta contra o nazi-fascismo na Itália e a derrota do III Reich, os ventos da democracia começaram a soprar no Brasil. Saltava à vista a contradição de enviar soldados para lutar contra ditaduras na Europa e permanecer vivendo sob um regime autocrático aqui. Esperto, Vargas promoveu a redemocratização: anistiou presos políticos – inclusive Prestes, que ficou preso durante nove anos -, legalizou partidos políticos, acabou com a censura e marcou eleições presidenciais para 2 de dezembro de 1945. Neste ponto, as forças oligárquicas que tinham sido apeadas do poder pela Revolução de 1930 e retornaram à cena política com o Manifesto dos Mineiros de 1942, começaram a se rearticular em torno da candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes, da UDN. Embora apoiasse formalmente a candidatura do marechal Eurico Gaspar Dutra, seu ministro da Guerra, nos bastidores Vargas incentivava o movimento “queremista”, (“queremos Getúlio”), que pedia a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte antes das eleições, o que permitiria ao presidente concorrer novamente ao cargo. Prestes e o PCB apoiaram o movimento varguista, porque a manutenção de seu governo estava de acordo com sua linha política, baseada no anti-imperialismo e na aliança com as forças progressistas nacionais. Além disso, o apoio dos comunistas a Getúlio expressava também a diretriz do Kremlin de formação de uma "frente popular" nos países que lutaram contra o Eixo.

Prestes (à dir.) em comício de apoio a Vargas
Surfando na onda de popularidade, o presidente baixou, em julho de 1945, uma lei antitruste – conhecida como “lei malaia” – limitando a atividade do capital estrangeiro no país. A situação se tornou mais clara a partir de agosto, quando a manobra continuísta se evidenciou com a evolução do queremismo para a palavra de ordem “Constituinte com Getúlio”. Isso inquietou a oposição udenista, pois a Constituinte antes das eleições presidenciais significaria a preservação do poder nas mãos de Vargas. Nesse momento, quando as forças as forças getulistas e seus aliados estavam no máximo de sua capacidade de ação, desencadeia-se o golpe de Estado. Um grande comício pró-getulista, marcado para o dia 27, fora proibido pelo chefe de polícia do Distrito Federal, João Alberto. Getúlio reagiu, substituindo-o pelo seu irmão, Benjamin Vargas. Foi a gota d'água: coordenador pelo poderoso general Góis Monteiro, os militares afastaram o velho caudilho do poder em 29 de outubro de 1945.

Hermínio Sacchetta
Prestes era um burocrata a serviço de Moscou, como me disse uma vez em tom de blague o grande intelectual comunista Hermínio Sacchetta. Mas ele próprio reconhecia que, apesar disso, o “Cavaleiro da Esperança” era “um valoroso combatente”. Imagine-se o represamento de emoções a que ele teve que se submeter para subir no mesmo palanque de seu algoz e algoz de sua mulher. No entanto, visto à distância, esse gesto mostrou a fibra de um líder político gestado nas grandes lutas populares. Isso sem entrarmos no mérito de saber se o apoio dos comunistas à continuidade de Getúlio Vargas era politicamente correto naquele momento. Eu, modestamente, acho que era.

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