Há quase 50 anos, em 25 de agosto de 1961, o país foi mergulhado na mais grave crise institucional até então com a renúncia do presidente Jânio Quadros, eleito em outubro de 1960 com a votação de 5,6 milhões de votos, um recorde na época. Durante muito tempo, Jânio se esquivou de dar explicações convicentes sobre a renúncia; falou em "forças terríveis", mas nunca confirmou a versão de que o gesto faria parte de uma articulação para conquistar mais poder - algo como um golpe de Estado. Quer dizer, Jânio confirmou essa versão, sim, em 1991, meses antes de morrer, num depoimento a seu neto, Jânio Quadros Neto, e Eduardo Gualazzi. O depoimento está no livro Jânio Quadros, Memorial à História do Brasil, publicado em 1996 - uma compilação de discursos, artigos e entrevistas de Jânio destinada a consolidar a imagem "heróica" do janismo. Hagiografia à parte, o livro trouxe esclarecimentos fundamentais do próprio Jânio sobre a renúncia, mas curiosamente o trabalho foi ignorado pela mídia, que ficou 30 anos perseguindo o ex-presidente para desvendar o mistério da renúncia. Os únicos jornalistas que se interessaram pelo documento foram Ricardo Arnt, que escreveu uma biografia de Jânio, e Geneton Moraes Neto, que transcreveu parte do depoimento em seu blog em 2008.
Aqui, a transcrição do que Jânio falou sobre a renúncia:
"Quando assumi a presidência, eu não sabia da verdadeira situação político-econômica do País. A minha renúncia era para ter sido uma articulação: nunca imaginei que ela seria de fato aceita e executada. Renunciei à minha candidatura à presidência, em 1960. A renúncia não foi aceita. Voltei com mais fôlego e força. Meu ato de 25 de agosto de 1961 foi uma estratégia política que não deu certo, uma tentativa de governabilidade. Também foi o maior fracasso político da história republicana do país, o maior erro que cometi [...] Tudo foi muito bem planejado e organizado. Eu mandei João Goulart em missão oficial à China, no lugar mais longe possível. Assim,ele não estaria no Brasil para assumir ou fazer articulações políticas. Escrevi a carta da renúncia no dia 19 de agosto e entreguei ao ministro da Justica, Oscar Pedroso Horta, no dia 22. Eu acreditava que não haveria ninguém para assumir a presidência. Pensei que os militares, os governadores e, principalmente, o povo nunca aceitariam a minha renúncia e exigiriam que eu ficasse no poder. Jango era, na época, semelhante a Lula (estamos nos anos 90, NR): completamente inaceitável para a elite. Achei que era impossível que ele assumisse, porque todos iriam implorar para que eu ficasse. [...] Renunciei no Dia do Soldado porque quis senbilizar os militares e conseguir o apoio das Forças Armadas. Era para ter criado um certo clima político. Imaginei que, em primeiro lugar, o povo iria às ruas, seguido pelos militares. Os dois me chamariam de volta. Fiquei com a faixa presidencial até o dia 26. Achei que voltaria de Santos para Brasília na glória. Ao renunciar, pedi um voto de confiança à minha permanência no poder. Isso é feito frequentemente pelos primeiros-ministros na Inglaterra. Fui reprovado. O País pagou um preço muito alto. Deu tudo errado".
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