Em março de 2010 completam-se 30 anos do assassinato de dom Óscar Romero, arcebispo de San Salvador, ocorrido enquanto ele oficiava uma missa na capital salvadorenha. Alinhado à Teologia da Libertação, crítico feroz das injustiças sociais e da violação de direitos humanos por forças militares e paramilitares de seu país, dom Romero tombou fuzilado por pistoleiros dos esquadrões da morte de extrema-direita. Esses grupos foram criados pelo major Roberto D'Aubuission, descrito como "psicopata assassino" pelo próprio embaixador americano em El Salvador na época, Robert White.
O papa João Paulo II foi o pontífice que, sozinho, canonizou mais santos do que todos os papas anteriores juntos (483 entre 800). Mas com dom Romero, ele fez corpo mole. Não só nunca denunciou o crime ou exigiu sua punição como adiou o processo de canonização o quanto pôde. Já notórios reacionários viraram santos ou beatos (um estágio anterior à santidade) quase que da noite para o dia. João Paulo II santificou vários fascistas espanhóis, como o monsenhor José María Escrivá de Balaguer, fundador da Opus Dei e aliado da ditadura franquista. Ele morreu em 1975 e foi canonizado em 1992. Karol Wojtyla também beatificou o cardeal croata Aloysius Stepinac (à dir.), que durante a II Guerra Mundial abençoou o governo pró-nazista da Ustashi na Croácia, responsável pelo genocídio de 700 mil sérvios, judeus e ciganos.
Sem falar na madre Tereza de Calcultá, beatificada em 2003.
Ah, mas essa era mesmo uma santa, muitos dirão. Talvez, dependendo do ponto de vista sobre a matéria da qual os santos são feitos.
Ela se dizia pobre, mas recebia polpudas somas de dinheiro do banqueiro trapaceiro Charles Keating, por quem intercedeu perante a Justiça dos EUA. O juiz pediu que a madre devolvesse o dinheiro recebido de Keating, porque ele era roubado; ela ficou de bico calado. Outro que também "ajudava as obras" de madre Tereza era o ex-ditador do Haiti, Jean-Claude (Baby Doc) Duvalier, que surrupiava o dinheiro dos cofres públicos do país. E, ao receber o Prêmio Nobel da Paz (sim, outro equívoco da academia!) em 1979, a pia alma disse que o maior inimigo da paz era o aborto! (na época estavam em curso guerras devastadoras no Afeganistão, no Camboja e na África). Durante sua cruzada pelo mundo contra o aborto, o divórcio e o controle da natalidade, a santa mulher chegou a dizer que a Aids era um castigo divino enviado aos que tinham conduta sexual "imprópria".
Pensando bem, tendo em vista as companhias, é melhor que dom Romero não seja mesmo canonizado. Sua memória será mais dignificada se ele permanecer apenas no panteão dos cristãos engajados na luta contra a opressão e a injustiça, como Georges Bernanos (à esq.), dom Helder Câmara e Tristão de Athayde.
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
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Olá Claudio, a título de lógica deste brilhante artigo, no que concerne "as companhias" sugiro a inclusão na lista dos "dignos"; Bispo Dom Pedro Casaldáliga que cujas perseguições resultaram em sua renúncia da prelazia de São Félix do Araguaia, a qual fôra prontamente aceita pelo Papa João Paulo II; e o Frei Leonardo Boff que fôra severamente perseguido pela Igreja sob o comando do então Cardeal-Bispo Joseph Ratzinger, hoje Papa Bento XVI; e quantos tantos, nem tanto conhecidos...
ResponderExcluirCaro Adinaldo,
ResponderExcluirNomes bem lembrados, mas como eles ainda estão vivos, acho que não têm pressa em ir para o Panteão...
msalettec@gmail.com disse
ResponderExcluirOlá Claudio
Tive uma grande decepção ao ver que está demonstrando sua capacidade intelectual para atacar principalmente os mortos que não podem nem se defender. Você deveria lembrar que tem capacidade para fazer com sua inteligencia e intelectualidade coisas bem melhores
Mãe,
ResponderExcluirEu não ataquei os mortos; apenas critiquei a incoerência entre as palavras e os atos de certos religiosos. E o fato de o Vaticano usar dois pesos e duas medidas para selecionar seus santos. Também não inventei nada; tudo o que escrevi pode ser comprovado. E, embora não seja cristão, respeito profundamente aqueles que realmente viveram segundo esses princípios, como Dom Óscar Romero, Dom Hélder Câmara, Dom Paulo Evaristo Arns, João XXIII...
um beijo
...Esqueci de incluir os nomes da irmã Maurina Borges, presa e torturada pela ditadura militar, e da Madre Cristina, fundadora do Instituto Sedes Sapientae e grande defensora dos direitos humanos
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