Carlos Andrés Pérez morreu pela primeira vez no seu segundo mandato como presidente da Venezuela, entre 1989 e 1993. Ele fora eleito em dezembro de 1988, em meio a uma grave crise econômica, com um discurso anti-neoliberal em que descrevia o FMI e o Banco Mundial como "genocidas" e o primeiro como "uma bomba de nêutron, que mata as pessoas mas deixa intacto os edifícios". Ao tomar posse, em fevereiro de 1989, Pérez "esqueceu o que disse" e aplicou a receita dos genocidas de cortar gastos públicos, aumentar tarifas e liberar o preço dos combustíveis.
CAP no segundo mandato (1989-1993) |
O Caracazo: 500 a 3000 mortos |
Conseguiu um empréstimo de US$ 4,5 bilhões do FMI, mas provocou uma rebelião social como nunca antes naquele país, conhecida como Caracazo, cuja repressão deixou entre 500 e 3000 mortos. A situação social se deteriorou e, em 1992, CAP, como era conhecido, sofreu duas tentativas de golpes militares: a primeira, em 4 de fevereiro de 1992, liderada pelo tenente-coronel Hugo Chávez Frías, que anos depois seria eleito presidente; a segunda, muito mais sangrenta, em 27 de novembro daquele ano. Em 1993, Pérez foi afastado do cargo por ter desviado dinheiro de um fundo secreto. Foi condenado a 28 meses de prisão.
No primeiro mandato |
O Pérez que morreu naquela época foi o dirigente nacionalista e democrático forjado na luta contra a ditadura do general Pérez Jimenez, sob a liderança de Rómulo Betancourt e Rómulo Gallegos, que enfrentou prisões e o exílio. Foi o Pérez que venceu as eleições presidenciais de 1974 percorrendo quase todos os vilarejos do país defendendo a ideia de que o petróleo deveria ser usado como uma ferramenta de países subdesenvolvidos como a Venezuela para chegarem ao Primeiro Mundo, provocando a emergência de uma nova ordem internacional, mais equitativa. Aproveitando a crise de energia provocada pela Guerra do Yom Kippur, em 1973, Pérez nacionalizou as indústrias de petróleo, aço e alumínio do país. A gigantesca alta dos preços do petróleo provocou uma bonança econômica inédita na Venezuela, aumentando a capacidade do Estado de investir em programas sociais, mas ao mesmo tempo criando uma dependência do petróleo que fez do país uma Arábia Saudita andina, com PIB per capita altíssimo, mas quase nenhum investimento em infraestrutura ou na diversificação da economia. O modelo se revelou um gigante com pés de barro.
Pérez com o Omar Torrijos (esq.) |
Mesmo assim, Pérez promoveu programas de desenvolvimento sustentável quando ninguém falava nisso, o que lhe valeu o prêmio Earth Care em 1975. CAP teve um papel fundamental nos acordos entre o presidente americano Jimmy Carter e o dirigente panamenho Omar Torrijos que levaram ao acordo de devolução do Canal do Panamá aos panamenhos em 1977. Ele também ajudou a consolidar a transição democrática na Espanha, inclusive fretando um avião para trazer de volta a Madri o líder socialista Felipe González, então exilado.
Nem as denúncias de corrupção do primeiro governo tiraram a aura de progressista de Pérez. Fora do governo, ele se tornou vice-presidente da Internacional Socialista, na época em que era liderada por Willy Brandt, apoiando a expansão da organização para a América Latina, então dominada por ditaduras militares de direita. Pérez sustentou uma oposição tenaz a ditadores como Anastasio Somoza, da Nicarágua, e Augusto Pinochet, do Chile, que tinham apoio dos EUA. Quando retornou ao poder, simbolizava a esperança da volta dos bons tempos. Poucas vezes na história moderna dos povos as expectativas viraram pó tão rápida e tragicamente.
No final, o opróbio |
No dia de Natal, Carlos Andrés Pérez morreu pela segunda vez, aos 88 anos, no mais completo opróbrio.
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