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Policiais prendem argelinos em Paris em outubro de 1961 |
Em 17 de outubro de 1961, a polícia de Paris prendeu cerca de 11 mil argelinos suspeitos de participar de uma manifestação pacífica organizada pela Frente de Libertação Nacional (FLN), movimento nacionalista que lutava pela independência da Argélia, então colônia francesa. Num eco trágico do regime colaboracionista de Vichy, os detentos foram enviados ao Parc des Expositions, o antigo Vélodrome d’Hiver, (velódromo de inverno), local de onde, em 1942, as autoridades francesas deportaram milhares de judeus. Em 1961, vários argelinos detidos foram torturados e alguns assassinados; seus corpos foram atirados ao Sena. À época, a polícia admitiu que dois argelinos tinham sido mortos; em 1999, uma comissão do governo concluiu que houve 48 afogamentos naquela noite e 142 mortes semelhantes nas semanas seguintes. O massacre foi ordenado por Maurice Papon, Prefect de Police (chefe de polícia) de Paris e ex-oficial de Vichy.
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Maurice Papon, oficial do regime colaboracionista de Vichy |
Durante a Segunda Guerra Mundial, sob o comando de Papon, aproximadamente 1.560 judeus – homens, mulheres e crianças – foram deportadas para Auschwitz. Ele também foi o responsável pela aplicação das leis antissemitas adotadas pelo regime de Vichy, desapropriando judeus de suas propriedades, empresas e terras. Em meados de 1944, quando a guerra se voltou contra os alemães, Papon se "engajou" na Resistência Francesa e lhes entregou vários oficiais nazistas. Com isso, ele conseguiu reconstruir sua história, escondendo seu passado colaboracionista.
Papon tornou-se um fervoroso “gaullista”. Participou ativamente da repressão à FLN na Argélia, recorrendo constantemente ao uso de torturas. Nomeado Prefect de Police de Paris em março de 1958, ele participou ativamente das articulações para a volta de Charles de Gaulle ao poder, naquele mesmo ano. Além do massacre de 1961, seu nome também está ligado à repressão em 1962 de uma manifestação contra o grupo terrorista de extrema-direita Organisation de l’Armée Secrète (OAS), organizada pelo Partido Comunista, e na qual 11 pessoas morreram.
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O líder oposicionista marroquino Ben Barka |
O chefe de polícia foi forçado a renunciar depois do seqüestro e assassinato, em 1965, em Paris, de Mehdi Ben Barka, líder da oposição marroquina. Policiais e agentes secretos franceses participaram da operação contra Barka, orquestrado pelo ministro do Interior do Marrocos, o general Mohamed Oufkir, e que resultou na sua morte. Ben Barka estava se preparando para ir a Havana para uma cúpula da Tricontinental, organismo que reunia líderes anticolonialistas e anti-imperialistas do Terceiro Mundo.
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Os canalhas também envelhecem |
As evidências sobre a participação de Papon na deportação de judeus surgiram em 1981, com a ascensão do socialista François Mitterrand ao poder. Em 1997, ele foi finalmente julgado e, no ano seguinte, condenado a dez anos de prisão (seria libertado em 2002 e morreria em 2007, aos 96 anos). Como no julgamento do oficial nazista Klaus Barbie – o “carniceiro de Lyon” –, dez anos antes, o affaire Papon trouxe novamente à baila o eterno mal-estar da França com o papel de seus compatriotas durante o regime de Vichy. Afinal, o número de franceses que apoiaram o marechal Pétain sempre foi muito maior do que os que se arriscavam a participar da luta armada na Resistência.
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