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terça-feira, 23 de março de 2010

A PRIMEIRA VITÓRIA DE OBAMA

A direita americana não conhece a História. Sua virulenta oposição à reforma do sistema de saúde proposta pelo presidente Barack Obama atingiu as raias do absurdo, com extremistas como o Tea Party acusando o mandatário democrata de querer "socializar" os Estados Unidos. Se fossem menos ignaros, esses trogloditas saberiam que o pioneiro na introdução de um sistema público de saúde e previdência social no mundo não foi nenhum esquerdista incendiário, mas um arquiconservador, o chanceler (primeiro-ministro) prussiano Otto von Bismarck. O "chanceler de ferro" acreditava que a diplomacia sem as armas era como a música sem os instrumentos e que há ocasiões em que se deve governar com liberdade e outras com mão de ditador. Bismarck introduziu os primeiros seguros obrigatórios cobrindo a doença em 1863, os acidentes de trabalho no ano seguinte e a invalidez e a velhice em 1889. Ele não fez isso por benevolência, mas para barrar o avanço do movimento operário e sindical capitaneado pelo Partido Social Democrata (SPD). Da mesma forma, o Welfare State (Estado do bem-estar social), adotado posteriormente pela maioria dos países europeus, foi uma resposta ao crescimento do movimento operário, radicalizado depois da Revolução Bolchevique na Rússia, em 1917. Com um movimento trabalhista menos combativo, os Estados Unidos ficaram na condição de ser o único país avançado que não garante assistência médica a todos os seus cidadãos. Desde os anos 1930, presidentes democratas tinham fracassado na tentativa de implantar o acesso universal à saúde. O último a sentir o amargo sabor da derrota foi Bill Clinton. Hillary Clinton, que conduziu o projeto de reforma, ganhou o ódio eterno dos conservadores. A cobertura universal foi também uma das últimas grandes batalhas do senador Teddy Kennedy.

Obama fez uma aposta política arriscada e ganhou. Enfrentou o ataque histérico da direita hidrófoba e de boa parte da opinião pública. Com isso, já garantiu um lugar na História por ter acabado com um sistema que deixava 32 milhões de americanos à margem, permitindo que grandes seguradoras privadas excluíssem cada vez mais doentes dos planos de cobertura. "Nós pagamos para ter assistência enquanto não tivermos qualquer doença que possa exigir pagamento caro. Aí, a seguradora cortará nossas pernas", escreveu Nicholas D. Kristof no New York Times.

"Por mais caro que pareça o seguro social, ele sairá mais barato do que uma revolução", advertia o conservador Bismarck. Sofisticado demais para fãs de Mel Gibson, da Sarah Palin e da KKK.

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