Em setembro 2007, a jornalista e ativista canadense Naomi Klein publicou o livro The Shock Doctrine: The Rise of Disaster Capitalism (A Doutrina do Choque: a Ascensão do Capitalismo de Desastre), no qual descreveu como as grandes corporações multinacionais e os Estados, principalmente o americano, aproveitam dos desastres naturais, das guerras ou outros choques culturais para avançar políticas de liberalização econômicas. Isso produz empobrecimento das populações, enriquecimento de uma minoria de capitalistas sem escrúpulos e, normalmente, tumultos que são duramente reprimidos. Para ela, esses modelo nasceu há 50 anos, na Universidade de Chicago, por inspiração direta de Milton Friedman, o papa do neoliberalismo e guru econômico de Pinochet.
Veja o que aconteceu com após o furacão Katrina, exemplo clássico do capitalismo do desastre. Não considero o Katrina um desastre "natural" porque foi envolveu uma clara omissão do Estado - no sentido de que as barragens estavam deterioradas. Imediatamente depois do ocorrido, um político republicano, Richard Baker, disse ‘não pudemos limpar os projetos de conjuntos habitacionais, mas Deus fez isso por nós’. Isso é o capitalismo do desastre! [...]. Mas, o que há de novo aqui, e que vimos em Nova Orleans, é que não apenas o desastre foi utilizado para a privatização do sistema educacional e habitacional, mas a resposta ao próprio desastre foi vista como oportunidade de mercado. E essa é realmente a última fronteira para o neoliberalismo. Todas as partes do estado foram privatizadas: estradas, eletricidade, telefone, água. Havia sobrado apenas as funções fundamentais: os militares, a polícia, os bombeiros. Mas agora estamos assistindo ao surgimento de um complexo do capitalismo do desastre: negócios que dependem diretamente desse conjunto de crises e desastres. Bombeiros privados, empresas como a Blackwater (empresa militar privada), que apareceu em Nova Orleans pronta para substituir a policia, o Helpjet, um serviço que proporciona um plano de fuga rápido e luxuoso, com direito a limosine, no caso de furacão. Acho que estamos vendo isso agora na crise dos alimentos, no sentido de que esse desastre torna altamente lucrativo o setor corporativo do agrobusiness. Acho que precisamos entender os desafios que enfrentamos, principalmente relativos à mudança climática. Está muito claro que existe uma parcela da economia cujo desempenho é favorecido conforme a situação piora. Não são apenas as empresas de armamentos. São as companhias de petróleo, de agronegócios, de biocombustíveis, farmacêuticas, empreiteiras, companhias de segurança. Precisamos mapear essas empresas que, com um lobby poderoso, impedem mudanças efetivas para nos tirar desse processo de crises contínuas”.
A Doutrina do Choque from Muito Aterrorizado on Vimeo.
Naomi Klein |
Numa entrevista, ela ligou o conceito de capitalismo de desastre ao de "destruição criativa", de Joseph Schumpeter, no sentido de que o capitalismo cria crises e executa constantemente criação e destruição. Segundo a autora, “trata-se aqui de uma estratégia política deliberada, de uma filosofia de poder; não apenas de ciclos naturais do capitalismo, em que uma nova tecnologia destrói um modelo econômico anterior e, a partir dessa destruição, um novo nível de criação surge. Trata-se de um conceito que foi profundamente compreendido e articulado por Williamson: que você precisa de uma crise para aprovar um conjunto específico de diretrizes econômicas. Acho que há algo de novo e antigo no que estou documentando.
Vítima do furacão Katrina, que atingiu New Orleans em 2005 |
Abaixo, um vídeo extremamente elucidativo - apesar da tradução capenga - sobre a “doutrina do choque e capitalismo de desastre”:
A Doutrina do Choque from Muito Aterrorizado on Vimeo.
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