Em 19 de abril de 2005, quando um Conclave se reuniu na Capela Sistina para escolher o sucessor do papa João Paulo II, dois candidatos eram favoritos: os cardeais Joseph Ratzinger, prefeito para a Congregação da Fé (antiga Inquisição) e líder da ala mais conservadora da Igreja, e Carlo Maria Martini, arcebispo emérito de Milão, último representante dos "liberais" oriundos do Concílio Vaticano II. Ratzinger foi eleito rapidamente, segundo analistas, por um acordo pelo qual Martini transferia seus votos para o prelado alemão em troca de uma reforma na Igreja. Não se sabe se o Espírito Santo foi consultado.
Cinco anos depois de Ratzinger ter-se tornado o papa Bento XVI, não só nenhuma mudança ocorreu como a Igreja Católica enfrenta sua mais grave crise de credibilidade desde a Reforma Protestante de Martinho Lutero, no século XVI, segundo avaliação do teólogo dissidente Hans Küng. Grande parte dessa crise deve-se à maneira desastrosa como o Vaticano reagiu às denúncias de milhares de casos de pedofilia praticados por clérigos católicos e as suspeitas de que Ratzinger, como arcebispo, protegeu padres pedófilos. Segundo a brilhante definição de Thomas Rees, padre e pesquisador da Universidade de Georgetown, "João Paulo II foi ator quando jovem e aprendeu a prestar atenção em sua platéia. Bento XVI nunca teve esse tipo de experiência, ele era um professor alemão. Enquanto seu antecessor era muito sensível a como sua mensagem estava sendo ouvida e percebida, Bento XVI está mais preocupado em ter certeza de que sua linguagem está tecnicamente correta". De fato, ele é um intelectual para o qual questões doutrinárias têm primazia sobre o mundo real; ele prefere uma Igreja de "poucos, mas bons", recusando-se a descaracterizar a doutrina para ganhar fiéis - um papa "leninista", em suma.
Já Carlo Maria Martini é a antítese de Ratzinger, embora ele seja um jesuíta. No passado, os jesuítas foram a tropa de choque da Igreja e por isso eram admirados pelos bolcheviques. Mais recentemente, essa ordem fundada por Inácio de Loyola se converteu num dos setores mais progressistas do clero católico. Martini, de qualquer modo, provocou calafrios na Cúria Romana ao questionar a obrigatoriedade do celibato para sacerdotes e ao pedir o fim das proibições da pílula anticoncepcional e da ordenação de mulheres. Ele teve ousadia para defender homossexuais e elogiar Martinho Lutero por ele ter pedido reformas à Igreja. Antes disso, o cardeal teve um debate epistolar público com o escritor Umberto Eco sobre temas como a ética, a mulher e o diálogo com os não-crentes - publicado num livro com o significativo título de Em que crêem os que não crêem? É verdade que Ratzinger também teve seu momento de diálogo com um intelectual laico e de esquerda, Jürgen Habermas. Mas o papa, como bom agostiniano, jamais foi capaz de descer à Cidade dos Homens. (Martini, à propósito, é tomista).
Se Carlo Maria Martini tivesse sido eleito papa em 2005, o Vaticano certamente não estaria tão encrencado...
segunda-feira, 19 de abril de 2010
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Me desculpem, creio em Deus, no ser superior mas religião foi, é e sempre será um negócio.
ResponderExcluirCláudio, é lamentável que o tempo presente da Igreja Católica sempre se defasou com o da Sociedade Universal, haja vista na ciência com Nicolau Copérnico, Galileu Galilei, Giordano Bruno. Nas relações humanas este tempo se defasa no tocante ao divórcio, células troncos , contraceptivos. Agora assistimos, esterrecidamentes, o manifesto desdém desta Instituição quanto aos seus clérigos; impunes praticantes de crime de lesa-humanidade que é a pedofilia. Até quando? Só Deus sabe?
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