O presidente da Costa Rica, Óscar Árias, escreveu uma carta aberta ao presidente do Uruguai, José Mujica, na qual propôs a abolição das Forças Armadas daquele país platino. Na carta, Árias argumenta que as Forças Armadas são a fonte da "mais ingrata memória coletiva" na América Latina. "Foi a bota militar a que pisoteou os direitos humanos em nossa região. Foi a voz do general que pronunciou as mais cruentas ordens de captura contra estudantes e artistas. Foi a mão do soldado que disparou nas costas do povo inocente. No melhor dos cenários, os exércitos latino-americanos representaram um gasto proibitivo para nossas economias; no pior, significaram um obstáculo permanente para nossas democracias". É uma proposta sedutora mas traiçoeira, como as de muitas Ongs que mascaram interesses escusos.
A carta de Árias vem embalada na autoridade moral de seu país: em 1948, depois de uma cruenta guerra civil, o presidente José Figueres Ferrer (à dir.) aboliu as Forças Armadas da Costa Rica, no bojo de um amplo programa de reformas. Sem dúvida, foi um feito audacioso no início da Guerra Fria, quando Washington começava a armar e treinar os exércitos de países do Terceiro Mundo para que preservassem a ordem pró-americana, abrindo um período de golpes militares. Foi assim no Irã em 1953 e na Guatemala em 1954, entre outros. Ao abolir a instituição militar, a Costa Rica conseguiu se livrar dessa praga. E o próprio Árias, como presidente costa-riquenho na década de 1980, incentivou o processo de paz na América Central, num momento em que os Estados Unidos tentavam, armando um movimento insurrecional, depor o governo sandinista da Nicarágua.
Mas o ressurgimento dessa proposta neste momento histórico está completamente fora de contexto. Depois de décadas de ditaduras militares, os países sul-americanos estão em processo de ajuste de contas com suas Forças Armadas para torná-las aptas às novas tarefas dos tempos democráticos e globalizados. Por trás das boas intenções de Árias está o desejo do Pentágono, verbalizado pela primeira vez nos anos 1990, na época de George Bush (pai), de que os Exércitos latino-americanos deveriam ser substituídos por forças policiais, tornando-se meras forças auxiliares dos EUA no combate ao narcotráfico. Assim, Tio Sam, que não precisa mais dos serviços dos militares para manter a ordem no quintal, garantiria a segurança externa dos países da região.
Esperto, Mujica recusou a proposta, que qualificou de "muito bonita" mas pouco realista. O ex-guerrilheiro disse que quer o Exército de seu país engajado na luta contra a pobreza. "É a última utopia", disse o ex-tupamaro.
segunda-feira, 5 de abril de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário