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sexta-feira, 24 de junho de 2011

FRANKFURTIANAS II


Adorno e Horkheimer
Continuação do texto do prof. Renato Ortiz:


“Mesmo se tomássemos todas as precauções seria difícil escapar a uma comparação. A desconfiança com que os frankfurtianos vêem a massa encontra certamente um antecedente neste tipo de literatura. Por isso Galvano della Volpe irá classificar o texto sobre o Iluminismo como um escrito ‘tardo-romântico’. Nele reencontramos pontos que aparecem explicitamente em Ortega y Gasset. Sabemos que Adorno considera o ouvido como uma metáfora que simboliza o refúgio espiritual em relação ao processo de massificação. Entre todas as manifestações culturais ele escolhe sempre a música como exemplo a ser analisado. Contra Benjamin, que considera o olho como órgão privilegiado da sensibilidade moderna, Adorno afirma que o filme se adapta melhor ao nacionalismo burguês. ‘Comparado com o olhar, escutar é arcaico e permanece um passo atrás da tecnologia. Poderia se dizer que reagir com o ouvido inconsciente, no lugar da apreensão ágil do olho, é uma maneira de estar em contradição com a era industrial avançada’. Mas é com o mito de Ulisses, que a metáfora da audição, encontrada em Gasset, se explicita melhor. Ulisses, ao tapar os ouvidos dos remadores, ao ser atado pelos marinheiros ao mastro do navio, pôde escutar o canto das sereias sem ser enfeitiçado por elas. Adorno e Horkheimer o consideram portanto como um precursor do Iluminismo uma vez que ele recusa atender o chamado de uma outra ordem que põe em risco a racionalidade do seu próprio mundo. Na sociedade industrial nosso herói mítico não mais necessitaria de fechar seus ouvidos, ele seria incapaz de reconhecer a música das sereias. ‘Hoje a regressão das massas consiste na incapacidade de ouvir o que nunca foi ouvido, de palpar com as próprias mãos o que nunca foi tocado’ (Adorno & Horkheimer). O homem massa seria portanto aquele que se conforma com a sua pequenez e é incapaz de perceber o que se encontra além dele. 
Oswald Spengler


Não é suficiente apontar o que há de comum a duas tradições de pensamento, importa ainda entender como isto é possível. Quando a Escola se ocupa do Iluminismo ela encontra um terreno já ocupado pelos românticos e pela literatura conservadora. No entanto ela leva a sério essas críticas e procura integrá-las dentro de uma perspectiva marxista. Para que isto ocorra, é necessário que os autores se contraponham à corrente marxista clássica, dominante na política e nas análises da sociedade. Horkheimer afirma, por exemplo, que um dos erros de Marx é pensar que a consciência será livre com o avanço das forças produtivas; para ele Marx não percebe que a desintegração da sociedade ‘antecipa suas sombras e que dessa maneira os homens regressariam a um estado mais bárbaro, cruel e primitivo’. Contrariamente à perspectiva que privilegia o progresso e a evolução da humanidade, principalmente Adorno e Horkheimer, preferem se voltar contra o barbarismo que eles identificam no processo civilizatório.

Não é por acaso que Adorno retoma o tema da regressão ao estado primitivo em seus comentários sobre Veblen; o que lhe interessa neste autor é perceber como ele denuncia o caráter bárbaro da cultura moderna. Mas é certamente nos comentários sobre a atualidade de Spengler e de seu livro A Decadência do Ocidente, que podemos discernir com clareza a posição dos autores. Mesmo divergindo de sua filosofia, Adorno enfatiza sua perspectiva de reversão do movimento histórico, como um antídoto ao otimismo liberal ou marxista. Adorno dirá em sua crítica ao marxismo: "para os adeptos do materialismo histórico, a ideologia liberal lhes parecia uma falsa premissa. Seus porta-vozes questionavam não a idéia de humanidade, liberdade e justiça, mas, sobretudo advogavam que a sociedade burguesa tinha realizado essas idéias. Para eles as ideologias eram mera aparência, mas aparências que continham verdades... Falar do crescimento dos antagonismos e admitir a possibilidade real da regressão ao barbarismo não era tomado suficientemente à sério... Conceitos como cultura continuam sendo aceitos no seu sentido positivo, sem que ninguém suspeite a dialética que o envolve, ou o fato que a categoria específica massa, é um produto da fase recente da sociedade, que transforma simultaneamente a cultura num sistema de arregimentação’ (Adorno). Em outro texto, Adorno retoma a mesma argumentação: ‘o irracionalismo da decadência denunciou a ausência da razão da razão subjugadora. Para ele a felicidade privada, arbitrária, privilegiada, é sagrada, porque é a única que garante o refúgio’. Não se trata, pois, de uma simples crítica ao progresso, a sociedade industrial é pensada como um retrocesso a um estágio inferior.”

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