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quinta-feira, 20 de setembro de 2012

CARLOS NELSON COUTINHO (1943-2012)


Carlos Nelson Coutinho
O filósofo marxista Carlos Nelson Coutinho, morto hoje aos 69 anos, era um dos maiores especialistas no pensamento de Antonio Gramsci. Ele organizou e traduziu toda a obra do pensador italiano no Brasil – particularmente os volumosos Cadernos do Cárcere – e também é autor da elogiada tradução para o português de O Capital, de Karl Marx. Discípulo do filósofo marxista húngaro Georg Lukács, militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) desde os 17 anos e adepto do Eurocomunismo – ao lado de Armênio Guedes, Leandro Konder e Luiz Werneck Vianna –, Coutinho rompeu com o “partidão” em 1982, depois do golpe militar na Polônia em 1981. Foi para o PT e depois para o PSOL. Nas pegadas de Gramsci, Palmiro Togliatti e Enrico Berlinguer, Coutinho foi um dos maiores defensores, no campo da esquerda marxista, da ideia de “democracia como valor universal”, que mais tarde ele aperfeiçoaria para “democratização como valor universal”.

Abaixo, trechos de uma entrevista que Carlos Nelson Coutinho concedeu em 2005 para a Revista Sem Terra:       

“No final dos anos 70, ainda sob a ditadura, houve um movimento associativista nas grandes cidades extremamente significativo, com a associação de moradores e favelados. Isso teve um papel importante no desgaste da ditadura e contribuiu para o fim do regime. Há um estudo que mostra que foram criadas mais associações no Rio de Janeiro, entre 1970 e 1980, que em todo o século 20. Foi um período muito rico. Portanto, é possível um associativismo urbano, inclusive de moradores de classe média e também favelados. Quem é culpado pela desativação do movimento social? É o PT ou o PT deu a guinada à direita porque o movimento social se enfraqueceu? Dialeticamente, são os dois fatores. Certamente, uma das nossas tarefas fundamentais é reativar o movimento social. O Gramsci tem uma frase muito bonita: um comunista deve combinar o pessimismo da inteligência com o otimismo da vontade. Não podemos ter ilusão na análise da realidade. Estamos vivendo uma realidade difícil. A esquerda está em retrocesso em todo o mundo. Tanto mais difícil é a situação tanto mais carecemos do otimismo da vontade para transformá-la. A análise pessimista não pode nos levar ao imobilismo. Ao contrário, deve nos levar a uma capacidade de ação e intervenção ainda maiores.”

Antonio Gramsci
“O Brasil é uma sociedade mais 'Ocidental' do que 'Oriental'. Há uma sociedade civil forte que se construiu e vem se construindo há décadas. Teve um papel importante na vida política brasileira no período dito populista. Foi reprimida duramente pela ditadura, e conseguiu se manter. Teve um papel decisivo no fim do regime militar. Mas há dois tipos de organização nas sociedades 'ocidentais': o modelo americano e o modelo ex-europeu — que está mudando. No modelo dos Estados Unidos, há uma sociedade civil organizada em torno de interesses puramente corporativos, com um associativismo limitado a questões extremamente particularistas. Faltam discussões dos grandes temas políticos. De maneira esquemática e simplificada, eu chamaria de 'ongzação'. Criou-se uma ideologia que redefine a sociedade civil com o reino do bem, do voluntariado e para além do Estado e do mercado. É um mito. A sociedade civil é terreno da luta de classes e de conflito profundo. Há uma tentativa de “americanização”. Querem transformar até mesmo o movimento operário em um instrumento puramente reivindicativo. É um risco.

[...]

“O sociólogo alemão conservador Robert Michels escreveu um livro chamado A sociologia dos partidos políticos, no qual faz um estudo empírico da social-democracia alemã para mostrar como um partido revolucionário e radical foi progressivamente se burocratizando e terminou por ser um partido pouquíssimo democrático integrado ao sistema. Michels chegou a criar uma 'lei de ferro da oligarquia': toda organização termina fatalmente oligárquica. Apesar de discordar da tese, é um risco real.”

[...]

“É um risco que inevitavelmente se correrá. Não é fatal que triunfe a burocratização. Eu continuo considerando o partido político como uma forma imprescindível na luta social. O partido revolucionário e transformador tem exatamente como função básica universalizar as demandas dos diferentes setores e colocar uma alternativa de sociedade. Para Gramsci, quando um partido não cumpre as suas funções, um intelectual importante, um jornal ou um grupo de jornais e um movimento podem ocupar a função. Se um partido não faz isso, um movimento social pode fazer, apesar de não poder ter a função precípua de um partido político.”


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