Há 20 anos, a mídia tupiniquim vivia seu auge, com a vitoriosa
campanha contra o presidente Fernando Collor, que ela mesmo havia incensado e
ajudado a chegar ao poder. Depois disso, inebriada, perdeu todo e qualquer
limite e passou a defender com unhas e dentes seus interesses corporativos.
O último suspiro de
influência da mídia
PAULO NOGUEIRA, Blog Diário
do Centro do Mundo
A imprensa construiu e destruiu Collor. Depois disso,
se dedicou a defender seus próprios interesses

Collor seria consagrado como "o caçador de marajás" por
jornais e revistas. Era descrito pela mídia como o homem perfeito: combatia
marajás – os funcionários públicos de altos salários – e era moderno. Este foi
o primeiro empurrão em Collor, e lhe permitiu chegar ao segundo turno das
eleições presidenciais.
Sua plataforma era a versão tosca em português da de Margaret Thatcher,
que então era tida como uma semideusa. Não haviam aparecido ainda os efeitos
sinistros do thatcherismo. Hoje eles são claros, impressos que estão na grande
crise econômica e financeira mundial. Mas quando Collor virou um pretendente
sério à presidência a fórmula de Thatcher – desregulamentar e privatizar —
parecia funcionar.
Como um Thatcher de calças, Collor cortejou e conquistou Roberto
Marinho, à época considerado amplamente o homem mais poderoso do país. Isso foi
essencial para o segundo empurrão dado em Collor: a edição mal-intencionada da
TV Globo do debate entre ele e Lula às vésperas da eleição. Lula não foi bem no
debate, mas na edição da Globo – vista por uma audiência gigantesca que já não
existe mais para a emissora – ele foi ainda muito pior. E então nosso Thatcher
virou presidente.
Collor cometeu o erro de achar que, porque andara de avião, podia voar
sozinho. Foi fatal. Não buscou alianças políticas, e não soube manter sequer o
apoio da mídia que tanto contribuíra para sua vitória. Sem base política, foi
jogado para o abismo pela mesma mídia que o alçara ao Planalto.
Foi o apogeu da imprensa como força política.
Em 1964, ela participara ativamente das ações para a derrubada do
presidente João Goulart – mas o papel principal coube aos militares. Em 1992, o
protagonismo foi da mídia. Passados vinte anos, o poder da imprensa é uma
sombra do que foi. Em parte porque a internet foi ocupando um espaço cada vez
maior. Mas também porque as grandes corporações de jornalismo não souberam
captar o zeitgeist, o espírito do tempo. E isso é fatal no jornalismo.
Em 1992, por exemplo, ler a Folha era considerado coisa de gente bacana.
Ela captara o espírito do tempo na campanha das Diretas Já. Hoje, na nova
geração de leitores, quem se importa com a Folha? O espírito do tempo agora se
manifesta em coisas como a inconformidade com a iniquidade social monstruosa
que varreu o mundo. Na agenda de que grande empresa de mídia se vê algum traço
desse inconformismo?
A maior demonstração da crescente falta de potência está nos resultados
das três últimas eleições presidenciais. Ganharam candidatos – Lula e Dilma –
que jamais gozaram do apoio da mídia, para dizer o mínimo.

No mundo perfeito, a mídia teria apontado esse drama e lutado para
corrigi-lo. Não fez. Fez o oposto, na verdade: se alinhou à manutenção de
privilégios e de mamatas. Por isso, vinte anos depois da queda de Collor, fala
apenas para os privilegiados – e não todos eles, mas aqueles que em seu egoísmo
sem limites ignoram e desprezam os desfavorecidos.
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