La Maja Desnuda, de Goya |
Dois textos, um do
Paulo Nogueira, ex-diretor da Época, outro do Jotavê, do blog do Nassif, dão
conta do mal-estar que atinge a grande mídia brasileira, ameaçada de ser
desmascarada pelo envolvimento com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, assim como um de seus áulicos, o ex-senador Demóstenes Torres, autoproclamado Catão dos Trópicos. Historicamente
comprometidos com os grandes grupos econômicos dominantes, implacáveis na destruição de adversários políticos e vivandeiras incorrigíveis, mas com discurso
pseudo-liberal, os barões estão ficando mais nus do que La Maja Desnuda , do
Goya...
O triunfo de Alberto Dines
Por Paulo Nogueira
O jornalista Alberto Dines tinha uma boa
definição sobre o código de conduta da grande imprensa brasileira. Era como se
as publicações pertencessem à “Hípica”, um clube fechado no qual, por mais que
os sócios se detestassem, ninguém falava publicamente nada de reprovável de
ninguém. Era bom para eles próprios, mas não, necessariamente, para o interesse
público.
O jornalista Alberto Dines |
Dines foi, ele próprio, uma exceção de
breve mas luminosa duração ao fazer, nos anos 1970, o ‘Jornal dos Jornais’ na
Folha, uma crítica domenical da mídia.
Não é exagero afirmar que a carreira
profissional de Dines nas grandes corporações foi praticamente liquidada por
causa do inovador ‘Jornal dos Jornais’, uma das experiências mais fascinantes
da história do jornalismo nacional. Dines teve que esperar a internet para,
nela, construir o Observatório da Imprensa, uma espécie de versão digital do
‘Jornal dos Jornais’.
Quando diretor da Editora Globo, propus
certa vez a João Roberto Marinho uma reportagem na Época sobre denúncias na
internet contra a grande imprensa. Num email a JRM, que é na prática o editor
das Organizações Globo, lembrei a frase de Dines sobre a Hípica. Bem, para
encurtar a história, a recomendação – ordem, usemos a palavra certa – foi para
não dar o texto.
Pois a Hípica foi invadida.
Na televisão e no mundo do papel, a
Record e a Carta Capital estão publicando coisas que jamais seriam levadas ao
público antes – excetuado o da internet.
Há interesses claros por trás da Record
e da Carta, e o público deve levá-los em consideração. A Record
quer derrubar a Globo, e tem um problema específico com a Abril, que publica a
Veja. A Carta, fora a simpatia por Lula, é dirigida por Mino Carta. Mino jamais
superou o trauma de sua saída da Veja, no final dos anos 1970. A cada dia, parece
detestar mais Roberto Civita, ao qual atribui sua saída. Se pudesse, Mino
marcaria um encontro com Civita numa próxima vida para um acerto de contas.
Do ponto de vista jornalístico, e
estilístico, o material da Carta é superior ao da Record. Basicamente, porque
Mino tem um talento extraordinário. E, ideologicamente, sua simpatia pelos
chamados “99%” – semelhante à social democracia europeia, representada no
presidente francês François Hollande – está muito acima da exploração da fé
feita pela igreja que controla a Record.
Fique, ainda uma vez, claro: há, claro,
viés no conteúdo da Record e da Carta sobre o que Dines chamou de “Hípica”. Não
existe nele o que os idealistas chamam de objetividade e imparcialidade.
Mas, mesmo com essa ressalva, o público
lucra com o novo quadro. Sobre isso não é dúvida. Da troca de tiros vai nascer,
na marra, um debate indispensável sobre quais são os limites éticos e legais do
jornalismo – até que ponto jornalistas podem ir à busca de informações.
Uma descarga de transparência na mídia –
nos nomes que estão aí e nos que porventura chegarem com a nova era digital –
pode não ser do interesse da “Hípica” de que falava Dines, mas é de absoluto
interesse público.
O governo e a convocação de Policarpo na CPI
Por Jotavê
Policarpo Jr., diretor da sucursal de Brasília de Veja |
A Globo,
ontem, fez o jogo dela. Sabe que a revista Veja corre o perigo de ir para a
fogueira e tratou de sair na frente, dando uma matéria no Fantástico a respeito
de Carlinhos Cachoeira. Nem uma palavra sobre Policarpo Jr., é claro. Faz
sentido. Afinal, a emissora foi parceira da Veja esse tempo todo.
Repercutiu uma a uma as matérias criminosas feitas pela revista, como o grampo
sem áudio. Se disser que Veja estava o tempo todo vinculada a um criminoso irá
admitir indiretamente que ela também estava. Nojento, portanto. Mas
compreensível.
Mais nojenta
e menos compreensível é a atitude dos parlamentares da base aliada na CPMI, que
vêm atuando como verdadeiros guardiões da revista, sabotando sistematicamente
todas as tentativas de convocar Policarpo Jr. para depor. O Partido dos
Trabalhadores não é uma pobre vítima do PMDB de Temer, como dizem alguns. É
CÚMPLICE de Temer. Ambos atuam em conjunto para proteger a revista. Há vozes
isoladas (não só nem principalmente do PT) pedindo a convocação. O PT enquanto
partido tem sido CONTRA.
Ao que
tudo indica, existe um acordo de "cavalheiros" entre o governo Dilma
Rousseff e a editora Abril. A revista Veja faria apenas críticas pontuais ao
governo, sem lançar nenhum tipo de campanha sistemática de desestabilização. Em
troca, o governo cerraria fileiras contra o envolvimento da revista na CPMI.
Agora, com o surgimento de novas evidências, o preço parece ter aumentado. Já
não basta mais "pegar leve". Tem que aderir. Tem que apoiar.
Anunciando na capa seu apoio ao governo Dilma Rousseff, a revista (para usar a
metáfora popular que vem tão a propósito neste caso) ficou de quatro. Não se
trata exatamente, como se vê, de uma posição política.
Meu
palpite é que o assunto ganhou dinâmica própria. Cada vez menos deputados
estarão dispostos a encobrir as falcatruas da revista. Temos que ficar atentos.
Minhas atenções, por exemplo, recaem sobre o deputado Protógenes Queiroz, em
quem infelizmente votei nas últimas eleições. No momento em que mais
precisávamos dele, sumiu. Fez tanto barulho, e na hora H não dá as caras. O delegado
deve explicações, sim, e não apenas a respeito da revista Veja. Vemos agora
quem era o Dadá que ele chamou para auxiliá-lo durante a operação Satiagraha.
Um capanga de Carlos Cachoeira. Um torturador a mando de um bicheiro, pelo que
mostram os áudios divulgados ontem pela Rede Globo. Não duvido que o silêncio
do delegado seja o produto de algum tipo de chantagem. Envolveu-se até o
pescoço com essa gente, que agora tem munição de sobra para usar contra ele,
caso não se comporte direitinho.
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