O artigo escrito pelo
professor Renato Janine Ribeiro no Valor Econômico de hoje – “Comunismo no
poder e fora dele” – vai muito além do lugar-comum imposto pela mídia
hegemônica em tempos de “realidade líquida”, para usar uma expressão cara a Zygmunt
Bauman. Em primeiro lugar, Janine Ribeiro lembra que o comunismo se distingue do fascismo
porque, se foi totalitário no poder, na oposição o comunismo representou uma
força fundamental na luta pela justiça social e contra a opressão política. Os
exemplos são muitos, principalmente na Europa ocidental, onde os Partidos
Comunistas se constituíram na vanguarda da resistência à ocupação nazista e impulsionaram decisivamente a construção do welfare state. Já o fascismo, mesmo quando estava na oposição, sempre foi
ditatorial e excludente. É só lembrar o terror que impunham nas ruas os squadristi “camisas
negras” de Mussolini e as SA (seções de assalto) “camisas pardas” de Hitler.
Outro dado importante, lembra Janine Ribeiro, a filosofia comunista
era humanista, herdeira dos ideais iluministas, enquanto que o fascismo sempre
foi abertamente racista, xenófobo e excludente.
Mas há mais. O fundamental é
que a ameaça comunista ou o temor a ele obrigaram o capitalismo a promover
reformas nas sociedades ocidentais. “O comunismo talvez tenha sido a melhor
oposição que o capitalismo pôde ter. [...] Isso resultou no que houve de melhor
no século passado – os trinta anos gloriosos, após a II Guerra Mundial, quando
o mundo (ou pelo menos o mundo então rico) mais se desenvolveu, econômica e
socialmente”, diz Janine Ribeiro. Isso me fez lembrar a afirmação de um dos
cabeças da perestroika e da glasnost, Alexander Yakovlev, depois que ele perdeu
as ilusões de reformar o stalinismo. Ele disse que o grande legado da Revolução
de Outubro não foi a libertação da sociedade russa, nem do proletariado russo,
mas a garantia de que a classe operária ocidental obtivesse importantes conquistas
sociais. Isso porque as burguesias do Ocidente temiam a repetição, em
seus respectivos países, do que ocorrera na Rússia em 1917. Então, para não entregar os
dedos, se desfizeram dos anéis. Como dizia o Paulo Francis quando ainda tinha
algum resquício de esquerda: “Se não fosse a existência da URSS, o capitalismo
transformaria o mundo em uma imensa Cingapura”. Mas, depois do colapso do
comunismo, acabou-se o “equilíbrio do terror” e o capital global, sem freios, passou a avançar celeremente, deixando a devastação atrás de si.
A ironia é que hoje o único país que parece capaz de salvar o capitalismo é justamente a China “comunista”, que
compra títulos da dívida dos Estados Unidos e vem alimentando a economia
mundial com seu crescimento médio de 10% ao ano. Marx explica?
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