Há 28 anos morria o líder do
Partido Comunista Italiano Enrico Berlinguer, que ficou conhecido por suas
iniciativas políticas ousadas, como o Compromisso Histórico – tentativa de
romper a coalizão conservadora do pós-guerra na Itália por meio da aliança
entre o PCI e a DC –, e o Eurocomunismo, projeto de unir os partidos comunistas
do Ocidente numa plataforma democrática, reformista e independente de
Moscou.
Uma década antes de Mikhail Gorbatchóv buscar reformar o regime soviético com a perestroika (reforma
econômica) e a glasnost (abertura política), Berlinguer remava contra a
corrente do bolchevismo oficial, defendendo a construção do socialismo com base
nas liberdades ditas “burguesas” e a ideia de democracia como valor universal. Herdeiro
das melhores tradições do comunismo italiano de Antonio Gramsci e Palmiro Togliatti, Berlinguer engajou-se, do início dos anos 1970 até a sua morte, em
1984, em um projeto de socialismo entendido como o ápice das conquistas democráticas nas esferas socioeconômica
e político-ideológica. Era, na verdade, um projeto de recuperação da liberdade
perdida no decorrer das experiências revolucionárias socialistas do século XX.
Sua proposta de Compromisso
Histórico surgiu da análise do golpe de Augusto Pinochet contra o governo da
Unidade Popular em 1973. A
experiência chilena mostrava que não bastava a esquerda conquistar o poder por
meios democráticos; era preciso também mantê-lo atraindo o centro político para
a aliança de modo a neutralizar a direita. Em suma, tratava-se de ampliar a política
antifascista das Frentes Populares dos anos 1930. A lição do Chile de
Allende era que a esquerda, mesmo democraticamente eleita, não conseguiria
governar tendo metade do país contra si.
Contudo, o Compromisso Histórico foi
torpedeado em 1978 pelo cretinismo político da extrema esquerda (as Brigadas
Vermelhas) e pela perfídia dos dirigentes da Democracia Cristã, particularmente
Giulio Andreotti, que não queria a aliança com o PCI. O líder centrista e
ex-premiê Aldo Moro, maior defensor da aliança com os comunistas, foi
seqüestrado pelas BV e a burocracia democrata-cristã não tomou nenhuma iniciativa
séria para sua libertação. E o PCI, que em 1976 conquistara sua maior votação
no país (34% dos votos), ficou na defensiva, tendo que condenar a ação das BV e defender a ação repressiva do Estado.
O Eurocomunismo surgiu com a
constatação dos comunistas italianos de que a energia progressista liberada
pela Revolução Bolchevique de 1917 tinha se exaurido, principalmente depois da
invasão da Tchecoslováquia pelas tropas do Pacto de Varsóvia, em 1968. Berlinguer
propunha uma espécie de “terceira via” entre o comunismo bolchevique – modelo
de economia estatizada e partido único – e a social-democracia – democracia com
manutenção da propriedade privada.
O líder comunista reformista eslovaco Alexander Dubcek |
As posições de Berlinguer se tornaram um
anátema para os comunistas ortodoxos e stalinistas, principalmente depois da
condenação, pelo PCI, da invasão soviética do Afeganistão (1979) e do golpe
militar-comunista na Polônia (1981). Sem fazer alarde, Berlinguer resgatou a
bandeira de outros comunistas heréticos como o húngaro Imre Nagy e o eslovaco
Alexander Dubcek.
O funeral de Berlinguer reuniu uma
multidão de milhões de pessoas em Roma, uma das maiores manifestações populares
da Itália, que contou até com adversários como Giorgio Almirante. O então
presidente socialista Sandro Pertini fez um dos mais emocionantes discursos de
sua carreira.
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