No final do século XIX e início do XX, os socialistas franceses Jean Jaurès (à esq.) e Jules Guesde protagonizaram um acalorado debate no seio da esquerda. Enquanto o primeiro defendia uma eventual participação dos socialistas num "governo burguês" para fazer frente aos setores mais reacionários da sociedade francesa, Guesde classificava essa postura como "traição" ao proletariado. (Por causa das posições maximalistas de Guesde, que se proclamava um marxista intransigente, o próprio Karl Marx chegou a dizer que ele, Marx, não era marxista...)
Jaurès considerava que o poder dos monarquistas, militaristas e católicos ultramontanos era ainda muito forte na França e que por isso deveria ser combatido em aliança com as forças liberais e progressistas. Ele lembrava o Affaire Dreyfus (à dir.), o caso do oficial judeu falsamentente acusado de espionagem e cujo processo opôs, de um lado, republicanos, socialistas e radicais franceses e, de outro, o Exército, a Igreja Católica e os nostálgicos do ancién regime.
O moderado Jaurès era, contudo, coerente: antimilitarista convicto, liderou campanhas contra o crescente rufar de tambores e a tentação patrioteira. Foi assassinado por um nacionalista em 31 de julho de 1914. Menos de um mês depois, a Europa mergulhou no conflito que iria arrastar no sangue e na lama das trincheiras as esperanças civilizatórias da Belle Époque.
Ironicamente, o intransigente Guesde (à esq.) mudou de opinião e integrou um governo de "união nacional". Ele se convertera ao nacionalismo, na espectativa de que a guerra levaria o país à revolução social - uma espécie de leninismo de gabinete (alguns diriam de fancaria).
Qualquer semelhança entre a trajetória do guesdismo - da intransigência ao oportunismo - a de certos dirigentes de esquerda de outros tempos e meridianos não é mera coincidência...
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