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quinta-feira, 29 de novembro de 2012

O APARTHEID ISRAELENSE

O militamte antiapartheid Ronni Kasrils, judeu, sul-africano e comunista  

Formado na melhor tradição humanista e socialista do judaísmo, Ronni Kasrils nasceu na África do Sul, se tornou comunista e militante antiapartheid, dirigente do Congresso Nacional Africano. Com a vitória do CNA em 1994, Kasrils foi ministro de Mandela. Nesta entrevista ele compara as práticas do Estado de Israel em relação aos palestinos ao apartheid – regime de supremacia branca que vigorou na África do Sul.   


Herói judeu e ministro de Mandela defende o “fim do apartheid de Israel”

Ronni Kasrils diz que “política de terrorismo de Estado de Israel é ainda pior do que a dos racistas sul-africanos”

Por Leonardo Wexell Severo, no site da CUT

Em seu “Livro das perguntas”, Pablo Neruda indaga: “Por que as árvores escondem o esplendor de suas raízes?”. E como se respondesse à inquietação do poeta chileno e ignorasse a minha pergunta, Ronnie Kasrils, sul-africano de pais judeus de origem russa, nascido em Joannesburgo, veterano militante da causa antiapartheid e ex-ministro de Nelson Mandela, iniciou a entrevista exclusiva mostrando o longo caminho percorrido até o Fórum Social Mundial Palestina Livre em Porto Alegre.

Da mãe, “doce, solidária e humanista”, aprendeu que a segregação a que os negros eram submetidos na África do Sul, com suas mais variadas formas de abuso e violência, “era o mesmo tipo de veneno imposto aos judeus na Europa”. Seu pai, um caixeiro viajante, vendedor de balas e doces para as segregadas e miseráveis comunidades negras, logo se converteria numa das principais lideranças sindicais da África do Sul. Desta combinação surgiu a indignação e o desejo da mudança. Daí até a militância clandestina, estimulado por uma prima comunista, foi um passo. A pele branca caiu como uma luva para as necessidades do movimento antiapartheid, até que foi banido de falar em público, de ir às fábricas, de reunir-se com mais de três pessoas e, finalmente, ficar desempregado. “A partir de então os racistas me deixaram com todo o tempo livre para me dedicar à luta contra o apartheid sul-africano”.

Por sua luta, Ronnie Kasrils foi reconhecido como “herói judeu”, título cassado após ter se pronunciado “contra o apartheid de Israel”. Dirigente do Congresso Nacional Africano (ANC), Ronnie esteve reunido com Che Guevara, participou ativamente ao lado de vários combatentes pela libertação do Continente, como Agostinho Neto, de Angola, e Samora Machel, de Moçambique, e foi ministro de Nelson Mandela. “A política de terrorismo de Estado de Israel é ainda pior do que a do apartheid sul-africano, pois o regime de segregação racial não cercava os bantustões – locais onde os negros eram concentrados e apartados da sociedade branca – nem os bombardeava com mísseis. Israel ergue muros e pratica crimes diariamente, covardemente, sem trégua, contra idosos, mulheres e crianças. Como disse certa vez um comandante militar israelense ao ver as barbaridades praticadas contra a aldeia de Deir Yassim, Israel está repetindo os nazistas”.

No auditório da Fecosul, Ronnie debaterá na próxima sexta-feira (30) sobre a Luta Palestina Anti-Apartheid – desafios, modelos e estratégias para a paz justa.

Abaixo, trecos da entrevista, que contou com a colaboração de Leonardo Vieira
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Como foi a sua participação na luta contra o apartheid na África do Sul?
A luta política contra o apartheid era pela não-violência, até que em março de 1960 um protesto pacífico em frente a uma delegacia de polícia foi banhado em sangue. O massacre deixou 69 mortos e representou um divisor de águas. Diante da brutal violência e repressão, discutimos que não havia outro caminho se não a resistência armada. Mandela me indicou como membro do comando de Durban e iniciamos ações que tinham como alvo os símbolos do apartheid, como os “Escritórios de classificação” onde os negros eram catalogados.

Catalogados de que forma?
Os racistas tinham 14 classificações diferentes para distinguir a inferioridade das raças. Iniciava pelo europeu e ia até o bantu, o mais negro de todos. Se uma pessoa dissesse que era branca eles olhavam as unhas, os dentes, como os nazistas faziam. Se um imigrante viesse do Líbano, devido à colonização europeia, era classificado como branco, se viesse da Síria era “de cor”. Atacávamos estes escritórios de classificação com uma regra: nunca matar ninguém. O objetivo era colocar abaixo os símbolos da opressão e do racismo. Isso inspirou muita gente a lutar e serviu como alerta ao regime de que era preciso mudar.

ESQUEÇAM O QUE NÓS FIZEMOS

Nos anos 1990, a social-democracia se converteu ao neoliberalismo econômico como quem tivesse encontrado a estrada de Damasco. Abandonando a herança do welfare state, os grandes partidos socialistas, social-democratas ou trabalhistas europeus adotaram alegremente as teses do chamado Consenso de Washington, que incluíam privatizações, abertura econômica à outrance e cortes nos gastos sociais. A onda neoliberal foi tão forte que arrastou até o histórico Partido Comunista Italiano (PCI), que chegou a ser o maior partido comunista do Ocidente, mas que foi tão afoito em virar centrista que perdeu a importância e deixou de ser referência.

Um dos grandes defensores dessa linha "transformista" foi o líder socialista espanhol Felipe González, que por longos quatro mandados (de 1982 a 1996) chefiou o governo da Espanha. Ao lado de outros líderes socialistas “modernos” – leia-se "neothatcheristas" – Tony Blair, Gerard Schröder, Massimo D’Alema, FHC –, González era a sensação dos “mercados” e de seus porta-vozes na grande mídia internacional. Pois bem agora, com o euro afundando, González está fazendo o caminho de volta: numa entrevista ao jornal Valor Econômico, ele critica a insistência da Europa em manter a austeridade para enfrentar a crise e cita o Brasil como exemplo de adoção de medidas anticíclicas (“neokeynesianas”). Abaixo, trechos da entrevista:
Valor – A Europa continua inoperante diante da crise. Como sair dessa situação?
Felipe González – Há duas falhas em nível europeu. Uma, de como a Europa enfrenta a crise, que resposta dá à crise, que podemos chamar de falha de estratégia diante da explosão do sistema financeiro internacional e sua consequência na Europa. E, a segunda, é uma falha estrutural, do modelo de uma união monetária sem união econômica, fiscal e bancária.
A falha em relação ao combate à crise é que a Europa é fortemente influenciada pela Alemanha, que é o único país com equilíbrios macroeconômicos favoráveis e único exportador de capital que resta no mundo ocidental, incluindo aí os Estados Unidos.
E a Europa enfoca a luta contra a crise cometendo um gravíssimo erro que vem do pensamento equivocado de que a crise era, primeiro, americana, conjuntural e seria superada rapidamente. Ou seja, o enfoque considera que a crise da dívida é uma crise de solvência, em lugar de crise de liquidez, de um corte brutal de crédito. Essa obsessão pelo problema da solvência está provocando uma dinâmica de insolvência de um ou outro país.
Temos, sem dúvida, um problema de dívida. A dívida pública da Espanha era significativamente menor do que a da Alemanha, Grã-Bretanha, França, e tínhamos superávit no orçamento de 2% em 2007.
Enfocam o problema sob a base da austeridade em duas dimensões: cortar o gasto público para reduzir o déficit e a dívida, aumentar as receitas pressionando os impostos, cortar o crédito. E não há financiamento da economia privada. Ou seja, renuncia-se a qualquer impulso neokeynesiano para alimentar a demanda. 
É verdade que há países sem margem para fazer esse impulso de incremento, mas a Alemanha tem. O Banco Europeu de Investimentos (BEI) tem. O único instrumento que resta, e foi o que fez os EUA, é a política monetária.
A Europa faz uma política monetária fundamentalmente pró-cíclica, não pela taxa de juro, que é reduzida, e sim pelo controle da liquidez. Como se produziu choque assimétrico ao implodir o sistema financeiro, a situação de países que passaram de contas públicas sadias e contas privadas muito endividadas para contas públicas que galopam no crescimento do déficit e da dívida é uma situação recessiva permanente. Não só não há política de gastos, como tampouco há política monetária que permita pelo menos ao aparato produtivo manter a liquidez, sem que a atividade caia.

A POLARIZAÇÃO ARGENTINA

Uma análise lúcida sobre as contradições do governo da peronista Cristina Kirchner e a campanha que lhe move a oposição ancorada em parte das classes médias e do jornal El Clarín, representante das oligarquias agrárias, que está prestes a perder fatias de seu poder oligopolista. Como pano de fundo,a discussão sobre a necessidade de se acabar com a “propriedade cruzada” dos meios de comunicação – coisa que, lá como cá, a direita raivosa transforma em “atentado à liberdade de imprensa”.
Argentina: as crises do vizinho (II)  
Eric Nepomuceno, no Carta Maior
Pretender negar é pretender não ver. A polarização vivida na Argentina, e concentrada acima de tudo em Buenos Aires, é séria. Tão séria, que todos no governo de Cristina Kirchner, e também entre seus apoiadores, têm plena consciência do fato, a começar pela própria presidente. Aliás, os detratores e oposicionistas também.

Essa polarização se dá entre uma instituição concreta, visível, palpável – o governo – e uma oposição tão furibunda como difusa, embora perfeitamente reconhecível. Uma oposição que não é institucional, ou seja, não atua através de partidos políticos no Congresso, não apresenta propostas alternativas ao projeto levado adiante pelo governo, não tem reivindicações específicas e justificáveis. É uma espécie de grande nebulosa. E, exatamente por isso, uma oposição sem interlocutores qualificados, com a qual é muito difícil dialogar. 

O sindicalismo organizado (vale recordar que a Argentina é o segundo país latino-americano, depois de Cuba, a contar com tantos trabalhadores filiados a sindicatos atuantes) está dividido. A oposição é exercida pelo dirigente dos caminhoneiros, um veterano bucaneiro que o falecido presidente Néstor Kirchner foi buscar sabe-se lá onde. Resgatado e transformado em aliado, Hugo Moyano, o flibusteiro em questão, rompeu com Cristina Kirchner assim que ela foi reeleita, em outubro do ano passado, e resolveu partir para o confronto direto. 

Suas reivindicações se escudam na questão salarial. Balela: o que ele quer é mais poder de barganha. Pretendeu eleger para o Congresso um número significativo de sindicalistas controlados por ele. Cristina fechou a porta e cortou suas asas. A vingança veio em seguida. É capaz de infernizar a vida do governo e de centenas de milhares de argentinos, tudo isso a troco de nada.

Setores significativos das classes médias urbanas, e uma vez mais é em Buenos Aires que se dá sua maior concentração, mostram uma resistência feroz a várias das políticas sociais levadas adiante desde 2003 no país, a começar pelas versões locais do Bolsa Família e pelos subsídios oferecidos às classes menos favorecidas em uma série de serviços públicos, que vão da energia elétrica e do gás ao transporte público. Oferecem mostras gritantes de uma intransigência a tudo que o governo de Cristina Kirchner leva adiante. Mostram uma capacidade de mobilização supostamente espontânea, mas que responde, na verdade, a um plano claramente estruturado por setores que deveriam – ao menos pela lógica elementar – ser antagônicos. 

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

LULA NÃO É GORBATCHÓV


Mikhail Gorbatchov
Lembro-me, quando estive na Rússia em 1996 para fazer a cobertura da reeleição de Bóris Yeltsin, de como nós, jornalistas ocidentais, corríamos para cobrir a votação do ex-presidente soviético Mikhail Gorbatchóv. Ao notar a escassez de interesse dos coleguinhas russos pelo ex-dirigente, perguntei o motivo a uma das únicas nativas presentes ao local onde ele votaria. “Gorbatchóv só interessa para vocês, ocidentais. Para nós, ele é uma farsa!”, disse ela em tom de aberto desprezo. Na época, fazia pouco tempo que Gorbatchóv deixara o poder (1991), abrindo caminho para o fim da União Soviética e a implosão do comunismo. Para os russos, fora um golpe mortal no orgulho nacional. Essa percepção era compartilhada pela maioria da população, tanto que Gorbatchóv teve míseros 1% dos votos e encerrou ali sua carreira política.   

A história, entretanto, certamente reservará a Gorbatchóv um papel de destaque. O último dirigente do Partido Comunista da União Soviética foi o grande responsável pelo fim da Guerra Fria ao promover reformas – a perestroika (reestruturação econômica) e a glasnost (abertura política) – para revitalizar o sistema instaurado na Rússia por Lênin e os bolcheviques em 1917. “Gorba” acabou destampando uma panela de pressão que levou ao fim do comunismo. Mesmo sabendo dos riscos, o líder soviético nunca recuou de sua determinação de abrir o regime e afrouxar o controle sobre os satélites soviéticos. Sem essa decisão, as revoluções de 1989, que varreram o stalinismo do Leste europeu, teriam tido o mesmo destino trágico das revoltas da Hungria, em 1956, e de Praga em 1968. Não por acaso, Gorbatchóv sofreu uma tentativa de golpe por parte da linha dura do PCUS em agosto de 1991, pouco antes da implosão da URSS.

Lula recebe o título Doutor Honoris Causa da Sci Po 
Algo semelhante ocorre no Brasil em relação ao ex-presidente Lula. Em recente artigo, o sociólogo Marcos Coimbra lembrou que apenas duas lideranças brasileiras são conhecidas internacionalmente: Lula e FHC. Mas a percepção da grande mídia e de nossos formadores de opinião sobre o reconhecimento internacional que ambos recebem é antagônica. Quando se trata do ex-presidente tucano, jornais, revistas e tevês registram as deferências com destaque e consideram “naturais” as celebrações de suas virtudes. Acham, inclusive, uma injustiça a baixa popularidade ostentada pelo “príncipe dos sociólogos”.

O flautista de Hamelin
Mas, quando se trata do ex-torneiro mecânico que chegou ao Palácio do Planalto, a coisa pega. Lula tem índices de popularidade inéditos na história republicana e é cada vez mais admirado no exterior – seja pela esquerda ou pela direita –, mas a mídia conservadora torce o nariz e ridiculariza cada vez que ele recebe alguma homenagem, não importa de quem. É como se todo mundo estivesse se deixando levar pelo flautista de Hamelin. Para os senhores da razão tupiniquim, Lula é tosco, manipulador, corrupto e empulhador. Sugerem que o povo não quer ver tais evidências porque é “comprado” pelo Bolsa Família, e que os estrangeiros são fascinados pela figura exótica do ex-líder sindical.

“Será que todo mundo – literalmente – está errado e a direita brasileira certa?”, pergunta Coimbra. “Só sua imprensa, seu porta-vozes e representantes sabem ‘quem é o verdadeiro Lula?’ O resto do planeta foi ludibriado pelas artimanhas do petista”?

Para a desgraça da direita, contudo, a semelhança termina aqui. Lula não é Gorbatchóv e sua popularidade continua intacta, apesar dos ataques virulentos e das tentativas recentes de ligá-lo a todos os malfeitos do país. O resultado das eleições deste ano, principalmente em São Paulo, explicam, além do preconceito, as razões para tanto ódio que a direita antediluviana local lhe dedica. 

Mas o lugar de Lula na História está reservado, se não ao lado de Gorbatchóv, com certeza num patamar muito superior ao de FHC. 
     

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

VOZ DISSONANTE NA GRANDE MÍDIA


O jornalista Paulo Nogueira, ex-diretor do Exame e da Época, foi na contramão dos articulistas da grande mídia e defendeu o indiciamento de Policarpo Jr., diretor de Sucursal da Veja em Brasília, pedido pelo relator da CPMI, Odair Cunha, pelas ligações suspeitas com Carlinhos Cachoeira.   

Por que é certo indiciar Policarpo

Por Paulo Nogueira, em seu blog

Quando jornalistas viram amigos de suas fontes, o interesse público é sempre o maior perdedor

Antes de tudo: não acredito que o jornalista Policarpo Júnior tenha tido, em suas relações com Carlinhos Cachoeira, a intenção de obter nada além de furos.
Joseph Pulitzer
Isto posto, do ponto de vista estritamente jornalístico, Policarpo foi longe demais em sua busca de notícias, como os fatos deixaram claro.
Policarpo infringiu uma lei capital do bom jornalismo, enunciada há mais de um século por um dos mais brilhantes jornalistas da história, Joseph Pulitzer: “Jornalista não tem amigo”.
Pulitzer sabia que a amizade acaba influenciando o discernimento do jornalista, e subtraindo dele a capacidade de enxergar objetivamente sua fonte. É um preço muito alto para o bom jornalismo.
Os telefonemas trocados entre Cachoeira e Policarpo não mostram cumplicidade, no sentido pejorativo de companheirismo em delinquências. Mas revelam uma intimidade inaceitável no bom jornalismo, uma camaradagem que vai além dos limites do que é razoável.
Tiremos o excesso das palavras que têm varrido as discussões políticas, jurídicas e ideológicas no Brasil. Somos, subitamente, a pátria dos “quadrilheiros”. Policarpo está longe de se enquadrar, tecnicamente, nesta categoria, e disso estou certo. Não vararia madrugada em redação se recebesse de Cachoeira mais que dossiês.
Mas, por ter se tornado tão próximo de Cachoeira, ele acabou se deixando usar por um grupo no qual o interesse público era provavelmente a última coisa que importava. Logo, havia um envenenamento, já na origem, nas informações que ele recebia e publicava. Que Policarpo não se tenha dado conta do pântano em que pescava denúncias não depõe a favor de sua capacidade de observar, mas miopia não é crime.
Minha convicção é que ele não terá dificuldades, perante a justiça tão louvada pela mídia por sua atuação no Mensalão, em provar que fez apenas jornalismo com Cachoeira – ainda que mau jornalismo.
Mas é necessário que Policarpo enfrente o mesmo percurso de outros envolvidos neste caso. Ele deve à sociedade, e ao jornalismo, explicações.
Teria sido infame não arrolá-lo. Isso teria reforçado a ideia de que jornalista é uma categoria à parte, acima do bem e do mal, acima da lei.
Não existe nenhuma ameaça à ‘imprensa livre’, ‘imprensa independente’ ou ‘imprensa crítica’ quando jornalistas são instados a se explicar à justiça. Esta é uma espécie de chantagem emocional e cínica que a grande mídia vem fazendo na defesa de sua própria impunidade e intocabilidade. Todos sabemos quantos horrores e desatinos  editoriais são cometidos sob o escudo oportuno da ‘imprensa crítica’. Nos países desenvolvidos, o quadro é outro.
Rebekah Brooks
Nesta mesma semana, a jornalista inglesa Rebekah Brooks, a até pouco atrás ‘Rainha dos Tabloides’ e favorita de seu ex-patrão Rupert Murdoch, foi indiciada pela justiça britânica sob a acusação de ter pagado propinas para policiais em troca de furos para um dos jornais que dirigiu, o Sun.
Nem Murdoch, com sua quase comovente devoção por Rebekah, cuja cabeleira rubra enfeitiça muita gente, se atreveu a dizer que a "imprensa independente" estava sendo agredida. Todos os jornais noticiaram o caso serenamente, com o merecido destaque.
Empresas jornalísticas não são instituições filantrópicas. Vivem dos lucros, e nisso evidentemente não existe mal nenhum – desde que os limites legais e éticos sejam respeitados. Em todas as circunstâncias, mesmo nas mais simples. Esta semana, para ficar num pequeno grande caso, o comediante Paulo Gustavo afirmou no twitter que a Veja fez uma reportagem com ele na qual o fotografou com uma camiseta amarela em que estava estampado Che Guevara. Segundo ele,  Che foi retirado da foto.
Do ponto de vista de ética jornalística, isso é admissível? Ou é uma pequena trapaça que pode dar origem a grandes? Tudo isso exige debate.
O episódio Policarpo é uma excelente oportunidade para que o Brasil discuta com transparência, como está acontecendo na Inglaterra, quais são mesmo estes limites, para o bem da sociedade e do interesse público.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

22 DE NOVEMBRO DE 1963

O presidente John F. Kennedy minutos antes do assassinato
Há quase 50 anos, em 22 de novembro de 1963, uma cena chocou o mundo: o presidente John Fitzgerald Kennedy era assassinado durante uma visita a Dallas, Texas. Dois dias depois, o suposto assassino, o ex-marine Lee Harvey Oswald, também seria assassinado a tiros quando era escoltado pela polícia do Texas após ter sido preso.

Lee Oswald 
Durante anos a fio, várias teorias conspiratórias vieram à tona: Kennedy teria sido vítima da máfia, por ter perseguido a organização depois de ter recorrido a ela para se eleger; dos exilados cubanos de Miami, pela retirada de apoio aéreo à invasão da Baía dos Porcos em 1961; e até do Complexo Militar Industrial, por uma suposta tentativa de retirar os EUA do envolvimento no Vietnã – na época havia apenas conselheiros militares – e de reduzir o número de mísseis balísticos intercontinentais nucleares norte-americanos.

Esta última tese, alimentada até por Hollywood (Oliver Stone e seu ridículo JFK, a pergunta que não quer calar), é particularmente estúpida, pois Kennedy nunca confrontou o “complexo”, muito pelo contrário, nem jamais cogitou de acabar com a corrida nuclear. Ele falava até em superar o suposto gap missile que haveria entre os EUA e a URSS; aliás, o programa de enviar o homem à Lua não teve outro propósito. Mas o fato é que ninguém, até agora, conseguiu desmentir as conclusões da Comissão Warren, de que Lee Oswald era um maluco que agiu sozinho. Acredite se quiser, mas provar o contrário ninguém provou.

Abaixo, várias versões do filme de Abraham Zapruder, que captou o momento dramático dos tiros disparados por Oswald com um rifle Mannlicher-Carcano com mira telescópica.                  







DE LEIS, JORNAIS E SALSICHAS


Otto von Bismarck fez o alerta sobre a imprensa
O relatório do deputado Odair Cunha (PT-MG), relator da CPMI do Carlos Cachoeira, provocou uma forte reação dos grandes meios de comunicação: editoriais do Estadão e da Folha e matérias dos colunistas do Globo. E podem esperar que vem mais por aí. O estopim de tanta ira santa foi o indiciamento, pela CPMI, de Policarpo Júnior, diretor da sucursal de Brasília de Veja. 

Neste texto abaixo, o jornalista Luis Nassif explica como esse indiciamento pode ajudar a grande mídia a rever suas práticas duvidosas. Pessoalmente, duvido; acho que é otimismo demais. Ver as práticas recorrentes dos grandes veículos da grande mídia tupiniquim me faz recordar a frase atribuída a Bismarck, de que é bom que o povo não saiba como são feitas as leis, os jornais e as salsichas.   

A importância do relatório da CPMI para a própria mídia

Luis Nassif, em seu blog

No final dos anos 90 escrevi um conjunto de colunas na Folha, sobre os desvios e abusos da cobertura jornalistica. 

Na Abril, Roberto Civita xerocou e enviou para diretores de redação  de diversas publicações. No Estadão, Ruy Mesquita encaminhou cópias para o diretor de Redação Aluizio Maranhão. Na RBS ocorreu o mesmo processo. Na Folha, além do espaço que me davam, havia a figura do ombudsman e do Painel do Leitor permitindo algum contraponto.
Da esquerda para a direita: Policarpo Jr., Carlinhos Cachoeira, Demóstenes Torres e José Roberto Arruda
Por trás desse interesse, a preocupação com um projeto de lei de um deputado federal de São José do Rio Preto – e, se não me engano, de Ibrahim Abi-Ackel – definindo de forma mais rigorosa punições contra abusos de mídia.
O projeto arrefeceu e, com ele, arrefeceu a intenção da mídia de praticar um jornalismo mais responsável.
De lá para cá, o jornalismo investigativo foi piorando e enveredando por caminhos que, muitas vezes, ultrapassaram os limites da legalidade. Especialmente depois dos episódios Veja-Opportunity e Veja-Cachoeira.
Criou-se um círculo vicioso do qual a própria mídia se tornou prisioneira.
Nos últimos anos, o padrão de jornalismo investigativo no país foi dominado ou por vazamentos de autoridades (MPF, PF, TCU etc), o que é legítimo, ou pelo relacionamento mais promíscuo com criminosos e lobistas – casos do “consultor  que acabara de sair da cadeia, invasão do hotel de José Dirceu, as capas da Veja sobre maluquices (como propinas de R$ 200 mil sendo levadas ao Planalto em envelopes), grampos obtidos de maneira criminosa etc.
Esse movimento acabou gerando uma competição degradante, que vitimou até profissionais sérios da mídia. É o caso de Eumano Silva, excelente profissional da revista Época, flagrado em conversas com pessoas ligadas a Cachoeira. Por que se envolveu com Cachoeira? Porque criou-se uma competição com a escandalização desenfreada da Veja que acabou pressionando profissionais sérios a seguirem modelos de atuação de diversos inescrupulosos que invadiram a profissão. 
O indiciamento de Policarpo Jr não significa sua condenação nem a da revista. Vai-se abrir um inquérito onde todas as partes serão ouvidas e todos poderão se defender. Mas – importante – permitirá uma freada de arrumação para a própria mídia e uma discussão séria, em um ambiente neutro, sobre os limites da cobertura jornalística.
A competição espúria
Ainda no final dos anos 90, escrevi um artigo sobre o fim do projeto Folha – como tal, entendida aquela simplificação de tratar todo funcionário público como preguiçoso, todo usineiro como caloteiro, todo banqueiro como ganancioso, todo movimento social como baderneiro.
Chegou-se a montar um seminário interno, na própria Folha,  para analisar a nova etapa, inclusive frente às novas mídia que cresciam. No fim, preponderou a visão medrosa: e se pararmos com nosso modelo atual e o Globo (que começava a crescer) ocupar o espaço? Minha resposta é que seria ótimo, porque era um espaço sem futuro.
Mas abrir mão de uma posição que deu a liderança, até aquele momento, por um novo estilo, exige coragem e determinação. E os veículos de mídia são extremamente conservadores e refratários a mudanças, com medo de perder a clientela, mesmo que declinante.
O indiciamento de Policarpo será a pausa para esse momento de reflexão da própria mídia. O caso será analisado pelo Ministério Público Federal e pela Justiça – poderes teoricamente neutros. A discussão abrirá espaço para uma revisão dos métodos atuais e para um revigoramento da liberdade de imprensa, porque, daqui para frente, calçada em princípios legitimadores, não nesse vale-tudo atual.
Nenhum procurador, de ofício, tomará a iniciativa de agir. Nenhum Ministro de tribunal ousará, porque iniciativas individuais são alvejadas com ataques pessoais que intimidam qualquer um. Daí a importância de uma ação institucional, que se inicie no Congresso, passe pelo MPF e pelos tribunais. Até para comprovar que não existem intocáveis no país.
Se a CPMI recuar, perder-se-á uma oportunidade única de melhorar o ambiente jornalístico e legitimar a ação da mídia.


quarta-feira, 21 de novembro de 2012

POLÍCIAS PARALELAS: ATÉ QUANDO?


Parte da ineficácia na política brasileira de segurança pública – cuja escalada dos assassinatos em São Paulo é apenas o último episódio – vem do fato de que, em todos os estados da federação, há duas polícias, uma civil e uma militar, com funções muitas vezes sobrepostas. Como já apontaram vários especialistas, o fim dessa dualidade seria uma condição necessária para o combate mais efetivo ao crime e o aperfeiçoamento democrático do país.

O que ocorre no Brasil é uma excrescência. A Polícia Civil exerce função de polícia judiciária; a ela compete fazer investigações depois da ocorrência dos crimes. Os delegados são os responsáveis pelo inquérito policial; eles têm que ouvir testemunhas, obter provas e chegar ao autor do delito. Depois disso, o inquérito é mandado para o Ministério Público e para a Justiça. Já à Polícia Militar é uma força preventiva, encarregada do policiamento ostensivo e da repressão ao crime.

A Polícia Civil já existia na época do Império, nas antigas províncias, com as mesmas funções investigativas, enquanto cabia ao Exército a repressão. Uma das razões da queda da monarquia, aliás, foi a recusa do Exército em servir como “capitão do mato” para capturar escravos foragidos das fazendas. Com a instalação da República, em 1889, as províncias se constituíram em Estados autônomos e seus governadores, representantes das oligarquias locais, montaram pequenos exércitos estaduais, as chamadas “Forças Públicas” ou “Brigadas”, que depois se transformaram na Polícia Militar.

A Força Pública de SP era um verdadeiro Exército
Em São Paulo, berço da oligarquia dominante no país durante a República Velha, a Força Pública foi formada pela Missão Militar Francesa, que somente muito depois treinaria o Exército nacional. A FP de São Paulo tinha armamentos pesados e até blindados e esse poder de fogo conferiu a ela um protagonismo militar nas revoluções de 1924, 1930 e 1932. Somente durante o Estado Novo as polícias estaduais foram submetidas ao poder central. Com a redemocratização de 1946, elas novamente voltaram ao poder dos Estados. A ditadura militar instalada em 1964 pôs as PMs como força auxiliar do Exército, militarizando-as e colocando-as sob o comando de oficiais superiores da força de terra (coronéis ou tenentes-coronéis). E a Constituição de 1988 não conseguiu mudar essa herança.

Na ditadura, a PM fez sua opção preferencial por pretos e pobres  
Uma das consequências mais graves dessa militarização foi o fato de policiais militares passarem a ser julgados por tribunais militares próprios, subordinados aos governos estaduais. Isso favoreceu, dentre outros efeitos colaterais, a impunidade, a corrupção e a formação de grupos de extermínio, como os esquadrões da morte. A violência policial e a tortura como método, principalmente contra as “classes perigosas”, se tornou marca registrada desse modelo policial. A sensação de impunidade policial também deu lugar a greves armadas contra os governos estaduais como forma de pressão trabalhista, como aconteceu este ano na Bahia.

Os Carabinieri da Itália: policiais comuns
Polícias militares não são exclusivas do Brasil; Alemanha, França, Itália, Espanha, Argentina, Chile, entre outros, têm suas forças policiais militarizadas: a Gerdarmerie; os Carabineiros; a Guarda Civil, a Polícia Federal etc. Em muitos desses países, as polícias militares cumprem papéis de investigação e coerção. Mas em todos eles, sem exceção, a polícia militar é uma força nacional, submetida ao poder central; o único país em que uma força militarizada é subordinada a governos locais é o Brasil, o que constitui uma ameaça potencial de estados ao governo federal. Nos EUA, por exemplo, são os prefeitos quem comandam a polícia, que é uma só e é civil, embora os policiais possam andar fardados e a instituição ter alguma hierarquia militar.
Violência, traço distintivo da PM militarizada
Depois da ditadura houve várias tentativas de unificar as polícias no Brasil, mas elas só ficaram no papel. O ex-governador paulista Mário Covas encabeçou a última delas. Mas ninguém parece ser capaz de vencer as resistências fortíssimas de ambas as polícias; a civil reluta na mudança porque ela não quer transferir ao Ministério Público a competência da investigação. Já a PM teme que, a exemplo do que acontece na França, Itália e Portugal, a unificação resulte no fim dos tribunais militares, que hoje permitem aos policiais militares brasileiros, em caso de prática de crimes, serem julgados por estes tribunais e não pela justiça comum. 

terça-feira, 20 de novembro de 2012

AS PORTAS DO INFERNO


A análise do conflito na Faixa de Gaza de um maiores correspondentes de guerra da atualidade, o britânico Robert Fisk, que cobriu vários conflitos no Oriente Médio sem jamais esconder sua indignação com a opressão e a violência da ocupação sob o manto diáfano da "objetividade jornalística". 
Não há nada capaz de impedir esse lixo de guerra?
Robert Fisk, The Independent 
Crianças atingidas por mísseis israelenses, que alegam "superioridade moral" para fazer ataques a civis 
Terror, terror, terror, terror, terror. Aqui vamos nós outra vez. Israel vai “extirpar o terrorismo palestino” – coisa que afirma fazer, sem sucesso, há 64 anos –, enquanto o Hamas, a mais recente das “milícias mórbidas” da Palestina, anuncia que Israel “abriu as portas do inferno”, assassinando seu líder militar Ahmed al-Jabari.
O Hezbollah várias vezes anunciou que Israel “abriu os portões do inferno” para atacar o Líbano. Yasser Arafat, que era um super-terrorista, em seguida um super-estadista – depois de adentrar o gramado da Casa Branca – e, em seguida, tornou-se um super-terrorista novamente quando percebeu que tinha sido enganado nas negociações de paz em Camp David, ele também falou das “portas do inferno” em 1982.
E nós, os jornalistas, estamos escrevendo como ursos malabaristas de circo, repetindo todos os clichês dos últimos 40 anos. A morte de Jabari era um “ataque direcionado”, um “ataque aéreo cirúrgico” – como os que mataram quase 17 mil civis no Líbano, em 1982, os 1.200 libaneses, a maioria civis, em 2006 , ou os 1.300 palestinos, a maioria civis, em Gaza, em 2008-9, ou a mulher grávida e o bebê que foram mortos pelos “ataques aéreos cirúrgicos” na Faixa de Gaza, na semana passada. Pelo menos o Hamas, com seus foguetes Godzilla, não reivindica nada “cirúrgico”. Eles são destinados a matar israelenses – quaisquer israelenses, mulher, homem ou criança.
Escombros de casas destruídas por bombardeio israelense em Gaza 
Como, na verdade, são os ataques israelenses em Gaza. Mas diga isso e você vai ser um nazista antissemita, quase tão mau e diabólico como o movimento Hamas, com o qual Israel negociou nos anos 1980, quando incentivou esse bando de mafiosos a tomar o poder na Faixa de Gaza e, assim, eliminar o exilado super-terrorista Arafat. A nova taxa de câmbio em Gaza por mortes de palestinos e israelenses atingiu 16:1. Ele vai subir, é claro. A taxa de câmbio em 2008-9 foi de 100:1.
E estamos criando mitos também. Jabari era o “líder das sombras número 1” do Hamas, de acordo com a Associated Press. Mas como poderia, quando sabemos sua data de nascimento, dados da família, seus anos de prisão por Israel, durante os quais ele mudou de lado, do Fatah para o Hamas? Aqueles anos de prisão não converteram Jabari ao pacifismo, não é? Bem, sem lágrimas, ele era um homem que vivia pela espada e morreu pela espada, um destino que, naturalmente, não vai afligir os guerreiros de Israel como os civis em Gaza.
Washington apoia o “direito de defesa” de Israel e reivindica uma neutralidade espúria – como se as bombas em Gaza não viessem dos Estados Unidos e como seguramente os foguetes Fajr-5 vêm do Irã. Enquanto isso, o secretário de relações exteriores da Inglaterra, William Hague, considera o Hamas o “principal responsável” pela última guerra. Mas não há nenhuma evidência disso. Segundo a revista The Atlantic Monthly, o assassinato por Israel de um “deficiente mental” palestino, que foi parar na fronteira, pode ter sido o estopim. Outros suspeitam que foi a morte de um menino palestino pelos israelenses, quando um grupo armado tentou atravessar a fronteira e foi confrontado por tanques. Caso em que militantes palestinos – não o Hamas – podem ter dado o pontapé inicial do jogo.
Mas não há nada capaz de impedir esse absurdo, esse lixo de guerra? Centenas de foguetes caem sobre Israel. Verdade. Milhares de hectares de terra são roubados de árabes por Israel para os judeus, e somente os judeus, na Cisjordânia. Não há sequer terra suficiente agora para um Estado palestino. O problema, curiosamente, é que as ações de Israel na Cisjordânia e seu cerco de Gaza estão trazendo para mais perto o evento que as trombetas de Israel temem anunciar a cada dia: que Israel enfrenta a destruição.
Ahmed al-Jabari, líder militar do Hamas assassinado por Israel
Na batalha de foguetes – inclusive os Fajr-5 do Irã e os drones do Hezbollah – uma nova fronteira está sendo cruzada por ambos os lados. Não se trata mais dos tanques israelenses cruzando a fronteira com o Líbano ou a fronteira de Gaza. Trata-se dos foguetes teleguiados, os drones e os hackers de computador – e a escória humana pelo caminho será ainda menos relevante do que tem sido ao longo dos últimos dias.
A Primavera Árabe agora trilhará seu próprio caminho: seus líderes vão ter de seguir o humor de seu público. Assim, eu suspeito, será com o pobre e velho rei Abdullah, da Jordânia. E se Benjamin Netanyahu acredita que o ataque dos primeiros foguetes iranianos exige o Big Bang do Irã, e depois o Irã dispara de volta – e talvez os americanos também e depois o Hezbollah – e Obama é engolido por outra guerra entre o Ocidente e o Islã, o que acontece então?
Bem, Israel irá pedir um cessar-fogo, como faz rotineiramente contra o Hezbollah. Vai pedir de novo o apoio eterno do Ocidente em sua luta contra o Mal, Irã incluído.
E por que não elogiar o assassinato de Jabari? Por favor, esqueça que os israelenses negociaram com Jabari, através do serviço secreto alemão, menos de 12 meses atrás. Você não pode negociar com “terroristas”, certo? Israel chama este banho de sangue de Operação Pilares da Defesa. Pilares da Hipocrisia seria mais adequado.


segunda-feira, 19 de novembro de 2012

STALINGRADO: ONDE OS RUSSOS APRENDERAM A VENCER

Tropas da Wehrmacht em Stalingrado: batalha rua por rua

Há 70 anos começou a grande virada da Segunda Guerra Mundial em Stalingrado (atual Volgogrado), cidade soviética ao lado do rio Volga: foi a Operação Urano, em que o Exército Vermelho cercou e aniquilou o 6º Corpo do Exército alemão. Até então, os exércitos do III Reich tinham avançado na Europa sem encontrar resistência significativa, exceto dos britânicos. A invasão da União Soviética pelas tropas da Wehrmacht tivera início em agosto de 1941, mas, apesar do grande avanço em território russo, a poderosa máquina de guerra alemã não conseguiu tomar as cidades de Moscou nem Leningrado. Josef Stálin, que havia expurgado a cúpula do Exército Vermelho em 1938 e menosprezado os avisos da invasão iminente em 1941, passou a dar ouvidos aos seus generais, que recomendavam um recuo tático até terem condições de contra-atacar.      

Então, os nazistas se voltaram contra a região do Cáucaso, de grande importância econômica e militar devido a seus recursos energéticos, industriais e agrícolas. A invasão do Cáucaso foi batizada Operação Azul e teve início em 28 de junho de 1942. No final de julho a Wehrmacht já tinha avançado até a linha do rio Don. Começaram os preparativos para a invasão de Stalingrado, às margens do Rio Volga.

Os generais Jukov (esq.) e Chiukov
Stálin nomeou o marechal Andrei Yeremenko comandante da frente sudeste; ele o comissário político Nikita Kruchóv (futuro dirigente da URSS que denunciaria os crimes do Pai dos Povos) ficaram responsáveis pela defesa de Stalingrado. Tropas soviéticas foram trazidas pelo rio Volga para formar o 62º Exército soviético, sob o comando do general Vassili Chuikov, que recebeu ordens de defender a cidade a qualquer preço.

A Luftwaffe (Força Área alemã), sob o comando do general Barão Wolfram von Richthofen (sobrinho do Barão Vermelho, Manfred von Richthofen, ás da aviação alemã na I Guerra Mundial), começou a limpeza, fazendo os Junkers 88, Heinkel III e os Stukas despejarem mil toneladas de bombas sobre os habitantes de Stalingrado. A cidade ficou em ruínas.

Em Stalingrado, os soviéticos lutaram com fuzis, granadas, facas e pás 
No dia 12 de setembro de 1942 seis divisões alemãs de infantaria do 6º Exército e uma de panzers fizeram o primeiro assalto a Stalingrado. O peso inicial da defesa da cidade ficou por conta de um regimento de artilharia antiaérea composto por jovens voluntárias, sem treinamento militar algum. O comando da divisão panzer que as enfrentou disse que foi necessário eliminar uma a uma até que todas as baterias estivessem destruídas. Milícias de trabalhadores também participaram da defesa da cidade, inclusive tripulando tanques saídos diretamente das linhas de produção.
  
Apesar de empurrarem os defensores da cidade para uma franja de terra à beira do rio, eles não capitularam. Os soviéticos, escavando o solo como se fossem tatus, afirmaram-se nas margens do Volga, lutando com granadas, fuzis, pistolas, facas e pás e com o que estivesse à mão, de rua em rua, de casa em casa, nas ruínas, nos esgotos, nos entulhos. Os nazistas chamaram aquele tipo de luta de Rattenkrige, a “guerra de ratos”. Uma das poucas elevações da cidade, a colina de Mamaev Kurgan, foi tomada e retomada várias vezes. As baixas do Exército Vermelho eram tão grandes que a expectativa de vida de um soldado em combate não passava de um dia.

A contra-ofensiva do Exército Vermelho foi o turning point da II Guerra 
Em 19 de novembro de 1942, sob o comando do general Georgy Jukov, os soviéticos iniciaram seu contra-ataque, batizado de Operação Urano, cujo objetivo era envolver as divisões alemãs em Stalingrado. Sob um frio intenso, o fogo de milhares de canhões soviéticos abriu caminho para a ofensiva de um milhão de soldados do Exército Vermelho, cerca de mil tanques – principalmente os famosos T-34 – e 1.400 aviões. As tropas do general Vatutin, que formavam a pinça norte do ataque, irromperam contra o flanco dos exércitos do Eixo, enquanto ao sul as tropas de Konstantin Rokossovsky faziam o mesmo.

Os alemães foram cercados pelo Exército Vermelho e as tentativas de abastecê-los por meio de uma ponte aérea fracassaram. O general Erich von Manstein tentou romper o cerco com uma operação chamada Tempestade de Inverno, mas as tropas cercadas no interior da cidade já estavam sem abastecimento há tempos e não tiveram condições de colaborar com as demais tropas alemãs. Os soviéticos continuavam seu contra-ataque – a Operação Saturno –, ameaçando envolver os exércitos de Manstein, que foi forçado a abandonar sua tentativa de salvamento e retirar-se.

O Marechal-de-Campo Von Paulus, que se rendeu aos soviéticos  
Em 2 de fevereiro de 1943, o que restara do 6º Exército alemão rendeu-se aos soviéticos, contrariando as ordens de Adolf Hitler. O general Von Paulus, a quem o Führer promovera ao posto de marechal-de-campo dias antes na esperança de que ele não se rendesse – até então, nenhum marechal-de-campo alemão tinha se rendido – assinou a capitulação final. Ao ser comunicado do desastre, Hitler disse a Goebbels: “os deuses da guerra trocaram de lado”. A batalha de Stalingrado durou cinco meses. Estima-se que as tropas do Eixo – alemães, romenos, italianos e húngaros – sofrem 850 mil baixas, enquanto que os soviéticos tiveram 2 milhões de baixas entre civis e militares. Foi o começo do fim do reinado de terror e miséria do III Reich.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

ELES QUE SÃO BRANCOS...

Patton, um dos malucos

Não existem coincidências no mundo da caserna e no da espionagem. O general David Petraeus era um líder militar competente, mas criou muitos inimigos no Exército por ser arrogante e dono de um ego maior do que o poder do Pentágono. Mas, perto de outros generais americanos famosos – como George S. Patton, Douglas MacArthur e William Westmoreland – Petraeus é um doce. Essa postagem do jornalista Eliakim Araújo faz um bom apanhado do “affair” que derrubou o chefão da CIA.
A soldada Lynndie England torturando um iraquiano
O general da CIA e os podres poderes
Do Blog do Eliakim Araújo
Urinar em corpos de afegãos mortos, matar inocentes aldeões daquele país pelo simples prazer de matar, metralhar do helicóptero um grupo de civis iraquianos desarmados, incluindo dois jornalistas, violentar soldadas, torturar presos... esses são os pecados cometidos pelos militares norte-americanos em suas aventuras pelo mundo.  Mas tudo isso virou café pequeno perto do baita escândalo envolvendo, por enquanto, dois generais quatro estrelas dos Estados Unidos e duas fogosas mulheres, ambas ligadas à comunidade de informações.
Se deprimente por um lado, a trama é fantástica do ponto de vista jornalístico, porque envolve traição, sexo e espionagem, com poderosos personagens do militarismo americano. O mais respeitado general quatro estrelas dos Estados Unidos, ex-comandante das tropas no Iraque e no Afeganistão, em seguida, diretor-geral da CIA, caiu em tentação e sua brilhante carreira militar desmoronou como um castelo de cartas.
O general Petraeus e sua amante, Paula Broadwell 
Casado há 37 anos, o herói fardado David Petraeus (60 anos), não resistiu aos encantos de uma mulher, Paula Broadwell (foto), casada, 40 anos e mãe de dois filhos, que durante seis anos esteve muito próxima dele, enquanto escrevia sua biografia.
Da intimidade entre personagem e biógrafa surgiu o romance inimaginável em se tratando de Petraeus, tão respeitado por sua seriedade e competência em assuntos de guerra, que chegou a ser cogitado levemente, lá atrás, para a presidência dos EUA.
Mas o romance entre o general e sua biógrafa teria ficado entre as quatro paredes do quarto em que se encontravam, nos EUA ou no Afeganistão, não fosse a aproximação de uma outra mulher, Jill Kelley, de 37 anos.
Aparentemente, Petraeus e Kelley, também casada, não tiveram um relacionamento íntimo, seriam amigos do tempo em que trabalharam juntos em um comando militar em Tampa, Flórida.
Mas, por algum motivo, Paula passou a ver em Kelley uma possível rival no coração do general. E tratou de afastá-la, mas o fez de maneira errada, através de emails ameaçadores, do tipo “afaste-se dele”, “ele é meu”. Kelley foi ao FBI e disse que alguém a estava ameaçando.
Daí em diante foi nitroglicerina pura. Os investigadores chegaram aos emails de Paula e, em seguida, aos de Petraeus. O FBI encostou o general na parede e avisou: é melhor você tomar a iniciativa de se demitir, porque a bomba vai estourar na sua mão.
E lá se foi o pequeno Petraeus – repararam como é baixinho e magrinho – para o cadafalso. Confessou seu pecado e pediu desculpas pela traição “à família e ao cargo de confiança na CIA”.
O general John Allen e e a suposta amante Jill Kelley 
Quando se pensava que o episódio estava, até certo ponto, controlado, eis que o FBI faz nova descoberta. Desta vez envolvendo outro general quatro estrelas, John Allen, comandante-geral das tropas aliadas no Afeganistão, que substituiu Petraeus quando este se aposentou no ano passado e assumiu a chefia da CIA.
Allen, este sim, seria amigo íntimo de Jill Kelley. O FBI interceptou centenas de emails trocados entre os dois, por enquanto taxados apenas de “correspondência imprópria”. O FBI faz questão de afirmar que não há nenhuma acusação formal contra o general Allen, mas deixou escapar que há entre 20 mil e 30 mil páginas de documentos relacionados a emails trocados entre os dois. A Casa Branca desmente, mas Allen pode ser o próximo a cair.
O glorioso Exército de Tio Sam, como visto nas produções hollywoodianas, está caindo de podre em seu comando e no comportamento de muitos de seus soldados que matam e morrem em guerras das quais nem sabem os motivos.
E pensar que, durante décadas, o falso moralismo dos militares impediu os homossexuais de entrarem nas forças armadas. Só eram aceitos se mantivessem segredo sobre sua orientação sexual, porque os generais achavam que seria uma suprema vergonha para a hierarquia militar, um soldado ser comandado por um homossexual.